3.12.12
SEGUNDA FOTOGRAFIA VIVER TERESINA, Elizabeth Oliveira
Quem visita o bairro Poti Velho pode ver as casinhas
miseráveis presas à terra.
Os meninos do Rio Poti brincam em completa alegria,
alheios ao abandono.
Têm o corpo marcado pela desnutrição.
Esquecidos, a cidade não lhes repara.
Nem o país observa sua própria miséria.
Os meninos do Rio Poti dependurados no horizonte.
Comigo-não-se-pode ironizam o homem,
acidente circunspecto em céu aberto.
Por que a vida aqui parece uma fotografia pardacenta
onde o tempo parou?
O primeiro bairro da cidade anualmente
confirma a tradição pública festejada:
acompanhado pelos fiéis,
São Pedro percorre as ruas em procissão.
O povo lhe devota o sagrado sentimento,
na intenção de dias melhores,
que as aves de rapina lhes prometem no período eleitoral.
O Cabeça de Cuia escuta a fome em danças,
crianças em roda, ao encontro do Rio Parnaíba
com o Rio Poti de braços dados com a gente ibiapiana.
Ao se tornarem adultos, os meninos do Rio Poti
(e os do Brasil) verão com espanto sua lembranças,
a infância tomada, de doídas medidas.
Que futuro pode ter o país
com essa massa (ignorada) de miseráveis?
EU E O BAR, Elizabeth Oliveira
Estou no Bar Nós e Elis. Vou ao encontro da vida.
Tento compreendê-la.
O que dizem as luzes, o clima festivo?
Garçom, uma música romântica,
pois não entendo meu coração.
O que mostram as pessoas, em sua trivialidade?
Estou entre olhares indiscretos, ao som da MPB.
Mistérios me espreitam: como suportá-los?
(compor poemas talvez resolvesse!)
A cidadezinha inventa o mundo entre sorrisos de bares
e me estranha a moça só, produzindo incessantemente
o poema da madrugada.
Mas, o que se passa com a terna cantora de noites "rolantes"?
Sou a moça da farda,
pioneira de muitos goles sozinhos,
detentora de tantos senões.
Garçom, um gole de Mallarmé,
pois estou com a cara suja de Fernando Pessoa espia a mim.
Estou com a boca cheia de estrelas e
ninguém vai ficar imune a isso.
Sou palavras e sua presença é meu costumeiro vampiro.
De fato a eternidade é muito extensa
pode conter a infinitude de certos momentos.
Onde quer que vá, segue-me a poesia, pretexto de vida,
me diz; "onde tu fores, te seguirei".
Com meu canto teço sementes à terra,
que é meu veredicto ser-lhe testemunho.
Garçom, uma dose de Ezra Allan Pound ou um duplo
Florbela Espanca Drummondiano.
Meus vampiros precisam de orgias,
para o texto que se segue e que me rege.
2.12.12
PONTE METÁLICA, Marcos Freitas
por aquela janela
alto do prédio
viam-se
carros / pedestres
famintos / sedentos
desenfreados
intenso ->vai-e-vem <-
o museu
com sua grandiosidade
em frente - barracas de camelôs
revoada de andorinhas
ao redor das torres do Amparo
anunciando o pôr-do-sol
no Parnaíba - ponte metálica
Marcos Freitas
em Urdidura de sonhos e assombros
Poemas escolhidos (2003 – 2007)
Rio de Janeiro: CBJE, 2010
MATURAÇÃO DAS ROMÃS ou H. Dobal revisitado, Marcos Freitas
"Quatro vezes mudou a 'stação falsa
Poemas escolhidos (2003 – 2007)
Rio de Janeiro: CBJE, 2010
25.10.12
Nathan Sousa - síntese biográfica
20.10.12
TRESIDELAS, Durvalino Filho
19.9.12
RODRIGO M. LEITE E A MUSA ESQUECIDA, por Elmar Carvalho
Tempos atrás, através de e-mail, mantive contato com o poeta Rodrigo M. Leite. Chamou-me a atenção o fato de que ele selecionou os meus poemas, publicados no A Musa Esquecida, da coletânea Poemágico – a nova alquimia. Por essa razão, mandei-lhe alguns de meus livros, cujo recebimento ele acusou. Elogiei os poemas que dele conhecia. Pediu-me escrevesse algo a respeito, pois pretendia publicá-los. Por causa de alguns contratempos, sobretudo relacionados com o assoberbamento de serviços em minha Comarca, mas também por causa de alguns compromissos de ordem pessoal, demorei a cumprir o prometido. Tento fazê-lo aqui e agora.
Tomei conhecimento da existência e do trabalho do poeta por intermédio de seu importante blog A Musa Esquecida, para o qual chamo a atenção de meus poucos e seletos leitores. Nesse espaço literário virtual, Rodrigo vem estampando belos poemas de autores piauienses, quase todos imersos em injusto esquecimento – daí o nome do sítio internético. Apesar do título – A Musa Esquecida – o blog não é nada esquecido, e tem retirado do olvido poetas valorosos. Desejo apenas que essa Musa continue a se lembrar dos poetas esquecidos.
Pedi, por bilhete virtual, que o poeta me mandasse sua síntese biográfica. Ele, demonstrando ser uma pessoa desprovida de empáfia e empavonamento, me mandou uma verdadeira “mini-síntese”, se é que se pode usar a expressão, de apenas duas linhas. Foi então que fiquei sabendo a sua idade. Tem ele apenas vinte e pouquíssimos anos. Nessa idade, eu praticamente não tinha biografia, exceto a que todos temos, mas tinha o coração cheio de sonhos e a alma repleta de ilusões. Pude realizar alguns de meus sonhos; de outros, me despojei, e alguns, perdi pelo caminho de minha vida. Algumas ilusões apegaram-se a mim, e ainda, teimosamente, me acompanham; outras, feneceram; aqueloutras, morreram, por mais que eu as aguasse.
Espero que o poeta tenha um grande baú cheio de sonhos, e que todos se realizem. Na sua idade, é proibido não sonhar. Tenho observado que alguns jovens literatos, para se sobressaírem ou para chamarem a atenção, gostam de aplicar bordoadas nos mais velhos. Não foi o método que escolhi. Não foi o caminho escolhido por Rodrigo M. Leite. Ao contrário, seu notável blog tem distinguido poetas bem mais velhos que ele. Isso parece demonstrar que é ele infenso à inveja e à provocação de escândalos e tumultos literários, que invariavelmente levam de nada a coisa nenhuma, posto que o eventual brilho não passa de efêmero fogo fátuo.
Sem dificuldade percebi que os seus poemas, embora inseridos no que existe de mais atual, não se perdem em vãs vanguardas, em superados formalismos. Também não enveredam em pretensiosos hermetismos, com que muitos pretendem adquirir a glórias de poeta sábio, filósofo, profundo, ou sibilino, quando muitas vezes não passam de mistificadores, inflados de presunção e bazófia. Igualmente não desejou seguir a trilha dos chamados poemas visuais, que nunca foram novidade, uma vez que em épocas remotas já se urdia o carmen figuratum, e já, faz várias décadas, que se comete o poema concretista.
Fiquei sabendo que ele só publicou até hoje uma plaqueta com seus versos. Isso denota que não é preocupado com quantidade, mas com qualidade. Pude sentir que seus poemas, embora sejam produtos da contemporaneidade, são impregnados das eternas lições da lírica de todas as épocas, da tradição que se mantém viva, porque amálgama da própria vida, porquanto embebida dos sentimentos que sempre existiram em todos os homens, a despeito de épocas, “ismos” e rincões.
Os seus versos cantam a vida, com seus encantos e vicissitudes. Suas metáforas são assimiláveis, e harmônicas ao conteúdo a que se referem. Por outro lado, não contêm imagens gastas, repisadas, inócuas, como comprimidos que já perderam o efeito. São límpidas e vívidas, e revestidas de novas substâncias, mesmo quando se reportam aos eternos temas da lírica de ontem e de sempre. Como Drummond, Rodrigo canta o tempo presente, as coisas e os homens presentes; mas como bom poeta, trata também de todos os tempos, até do des-tempo de um tempo sem tempo, “de um tempo sem medida, fugitivo / de ampulhetas e relógios”, como assinalei no meu Noturno de Oeiras.
Elmar Carvalho
Publicado originalmente no Blogue do Autor
BEIRA RIO BEIRA VIDA, Marcos Freitas
beira de rio
açucenas
Casa Marc Jacob
Armazém Paraíba
lavadeiras
fogão e geladeira
troca-troca cais
beira de rio
pescador na CEPISA
manguezal no São Pedro
balsas em travessia
lavadores em agonia
beira rio
quase morto
assoreado
noite e dia
Marcos Freitas
em Urdidura de sonhos e assombros
Poemas escolhidos (2003 – 2007)
Rio de Janeiro: CBJE, 2010
18.9.12
PRIMEIRA FOTOGRAFIA VIVER TERESINA
Tentar compreender este sinal esquecido na vastidão do país.
Povoam-lhe um mundo próprio e professo calor humano.
A uniformidade da cidade, as ruas pequenas,
casas tímidas; seus quarenta graus mostram tenacidade
dessa gente em mudar seu destino.
A natureza proclama as águas do cenozóico rio,
ela pede respeito ao Velho Monge.
Mas, como esquecer a classe medianamente comprometida
com oligárquicas posições?
Cidade que é outro lado também aponta, a vida fácil
e colunável e superfídia,
percebida no volume que auferem algumas rendas
e a massa submersa em carências.
Invadem em rios subterrâneos, luzes que são espírito e ponte,
os artistas da cidade - contemporâneos do mundo:
os pés na história local
e o rosto voltado para o universal.
O povo recolhe sua presença nos fins de semana e
finge não ver suas raízes fincadas ao chão.
Não é possível compreender-lhe a razão: elegem
seus candidatos como quem aguarda redentor.
Teresina, Verde Cidade menina,
teu solo é paixão, dor e terno afeto.
Caminha. A felicidade se esconde aqui,
mas só se mostra quando estamos no exílio.
20.4.12
SEMELHANÇA
O rio é como a gente,
se vai o tempo inteiro.
Sempre está ali:
à margem de nós,
passando.
Laerte Magalhães
15.4.12
TRISTEESINA
Marcos Freitas
em Urdidura de sonhos e assombros
Poemas escolhidos (2003 – 2007)
Rio de Janeiro: CBJE, 2010
10.4.12
VISTA DE TIMON, por Francisco Miguel de Moura
Onde o teu verde olhar, mulher?
No corpo não, nos olhos não.
Quanto asfalto, lixo, TV, esgoto, favela.
Prédios do INPS (agora INAMPS), do Hotel (Luxor)
Piauí e da Associação Comer-cia(I), entre
- mangueiras que não dão mangas -
perdido a gente se vê.
Do lado de cá te olhando
Como se admira um postal
bem nos olhos esta canção
senti.
Canção menor, de amor de mais
de quinze anos e um filho,
e dos dias já vencidos.
Volto a fita dos meus sonhos,
Ponho-me no âmago Poti/Parnaíba,
bem onde as águas se irmanam escuras
e os desejos se perdem,
e me declaro réu:
- Narciso em teus espelhos.
Francisco Miguel de Moura
em 145 anos: Teresina cidade futuro
Teresina: FCMC, 1997
19.3.12
TERESINA, Laerte Magalhães
A cidade é pequenina,
mas o sonho é imenso,
feito o rio mais extenso,
que nos banha e nos fascina.
Ao dobrar de cada esquina,
sob o céu que nos socorre,
cada rua que nos percorre
para o bairro a que se destina.
Barcos que, sob pontes,
conduzem também destinos,
homens, iguais a meninos,
são afluentes e fontes.
Nas veias correm também
veios de luz, raios vivos,
os rios passando altivos
são rios de querer bem.
No bulício da quermesse,
o calor que desatina,
o coração de Teresina
é o sol que nos aquece.
Laerte Magalhães
17.3.12
O PARNAÍBA, Martins Vieira
Vem de longe, tangendo alvacentas espumas
Ao sabor da corrente, eriçando cachoeiras;
Aqui, se aperta; ali, se espraia, enquanto as plumas
De leques vegetais baloiçam nas palmeiras.
Leva a flor que tranquila adormece entre as brumas
E se deixa impelir como as balsas fagueiras,
Onde geme o violão do embarcadiço, e algumas
Das cordas vão ferir as cordas verdadeiras...
- Ó rio lá de casa, ó Pai velho das crianças,
Águas que vão molhar, o solo e as belas tranças
Da noiva que se banha em ti, ao vento e à luz,
Ó rio benfazejo, aplacarás a sede
Do mar, deixando aqui o pão em cada rede
E a nós, pelo batismo, o nome de Jesus.
Martins Vieira
em Canto da Terra Mártire (1977)
apud A POESIA PIAUIENSE NO SÉCULO XX | Antologia
Organização, introdução e notas por Assis Brasil
Teresina / Rio de Janeiro: FCMC / Imago, 1995
16.3.12
O SONHO POSSÍVEL, Hardi Filho
Mil novecentos e oitenta e oito
Pra seu final o século caminha.
Mais um milênio! A festa se avizinha,
E é tema deste soneto afoito.
O tempo é de inflação (sobre o biscoito,
o pão, a carne, a banana, a farinha...)
Mas é também de avanço (antes não tinha
Moça donzela pronta para o coito).
A vida está um caos, um pardieiro
onde se faz de “tudo por dinheiro”
e a honra é um mar que quase já secou.
Em Teresina – Piauí – Brasil,