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21.8.16

Teresina anivessariou: 164 anos

Teresina, por Dino Alves

Quando eu nasci Teresina ainda ia fazer 100 anos no ano seguinte. Palmeirais, meu berço, nem tinha dez anos que deixara de ser Belém. Sou filho de cidades novas. Quase contemporâneas. E nesta semana Teresina aniversariou em dezesseis. Cidade menina. Parece um passarinho que troca de penas ainda pela primeira vez. 

Conheci cidades na Europa que conservam suas ruas e algumas construções de muito antes dos portugueses chegarem por aqui. Mas Teresina está abandonado o traçado geométrico que o jovem Saraiva imaginou, antes de virar Conselheiro do Império. Oeiras, mesmo abandonada para dar lugar à nova capital resiste no seu casario colonial centenário. Teresina queimou suas casas de palhas antes de fazer 100 anos. E vai chegar ao segundo século absolutamente irreconhecível no seu passado. Tem jovens que nasceram na cidade nova que nunca puseram os pés na cidade velha.

Inexorável, Teresina atravessou o rio Poty para o leste e esqueceu a cidade velha. A festejada ponte estaiada funciona como um portal moderno que nos faz adentrar na cidade nova, o que para mim – que a deixei há quarenta anos – não faz qualquer sentido. Sou contemporâneo da ponte metálica que nos separava de Timon, da Avenida – que nem precisava chamar de Serafim –, da Igreja das Dores, da Amparo, da São Benedito, da Pedro II, do Clube dos Diários, da Rio Branco, da Estação, do Marquês, da Vermelha, da Piçarra, do Poty Velho, do Mercado Velho, do Mafuá, da Vila Operária, do Porenquanto – bairro de nome poético que era pra ser provisório e está perpetuado no esquecimento da cidade antiga.

A minha saudade está esmaecendo e ficando sem lugar.

Quando Teresina aniversaria me lembro do poeta Lucídio de Freitas:

Teresina apagou-se na distância,
Ficou longe de mim, adormecida,
Guardando a alma de sol da minha infância
E o minuto melhor da minha vida.

E eu sigo, e eu vou para a perpétua lida.
Espera-me, distante, em outra estância...
É a parada da luta indefinida,
É a febre, minha dor, minha ânsia...

Como são infinitos os caminhos!
E como agora estou tão diferente,
Carregado de angústias e de espinhos!...

Tudo me desconhece. Ingrata é a terra.
O céu é feio. E eu sigo para a frente
Como quem vai seguindo para a guerra...


em 21 de agosto de 2016

29.1.16

EVOCAÇÕES, Lucídio Freitas


I


Como é bom recordar... Lembrando, a gente
Como num sonho de ouro se ilumina.
Recordação é fonte, alta e divina,
De onde brota o consolo do presente...

Recordar... reviver o que a neblina
Do tempo encheu de névoas, de repente...
Voltar atrás, rever, serenamente,
A alma e a cinza de um bem que não termina...

Como é bom recordar! Prolonga a vida
Vivendo os dias mortos, revivendo
Nas sombras outra sombra ainda querida...

Recordo. O pensamento esvoaça, a esmo.
Recordo, e recordando é que eu vou tendo
A infinita consciência de mim mesmo...



Lucídio Freitas
em POESIA COMPLETA
Teresina: Convênio APL/UFPI (1995)

4.11.11

EVOCAÇÕES II, Lucídio Freitas


II

Teresina apagou-se na distância,
Ficou, longe de mim, adormecida,
Guardando a alma de sol da minha infância
E o minuto melhor da minha vida.

E eu sigo, e eu vou para a perpétua lida,
Espera-me, distante, uma outra estância...
É a parada da luta indefinida,
É a minha febre, minha dor, minha ânsia...

Como são infinitos os caminhos!
E como agora estou tão diferente,
Carregado de angústias e de espinhos!...

Tudo me desconhece. Ingrata é a terra.
O céu é feio. E eu sigo para a frente
Como quem vai seguindo para a guerra...


Lucídio Freitas
em POESIA COMPLETA
Teresina: Convênio APL/UFPI (1995)

3.11.11

EVOCAÇÕES III, Lucídio Freitas


III

A saudade me aterra...
E que vontade eu sinto de chorar,
Distante do meu lar,
Vendo outro céu, vendo outro sol, vendo outra gente,
Tão diferente
Da gente boa lá da minha Terra!

A minha Terra... À noite, nas estradas,
Boêmios trovadores,
Desfolhando canções aos pés das namoradas,
Falam dos seus amores,
Enquanto o rir no Azul, nos seus cochins de prata,
As estrelas, em bando,
Ora cantam também e adormecem cantando
Ao som embalador da serenata.

Noite... O Vento, num suave murmúrio,
Passa serenamente,
Uma canoa desce lentamente,
Ao sabor da corrente,
Branda, leve, sutil, sobre as asas do rio.

Alguém passa, de rede a tiracol,
E vai, a noite inteira, trabalhar
Sem queixas e sem mágoas,
Para, ao vir da manhã, ao desabrochar do sol,
Quando as aves despertam pelos ninhos,
À casa regressar,
Trazendo o pão para a mulher e os dois filhinhos
- Áureo pão que arrancou do seio bom das águas...

E lá se vai, depois, de foice e enxada no ombro,
Murmurando do amor as alegres cantigas,
Embriagado da luz que pelos campos erra,
Resoluto e fiel, em doudo desassombro,
Colher do milho verde as douradas espigas,
Longe dos homens maus, da inveja vil, da guerra
Espalhando, feliz, outras novas sementes,
Encorajando os companheiros descontentes...
E à noite ei-lo de novo à procura da choça,
Vibrando de prazer,
De regresso da roça,
Trazendo o pão para os filhinhos e a mulher,
Áureo pão que arrancou do seio bom da Terra...

A vida da cidade embriaga e atordoa...
No campo a vida é assim humanamente boa,
Humanamente simples e perfeita:
É a caça, é a pesca, é o plantio e a colheita,
É a foice e o facão, a espingarda e a canoa.

E que gente modesta é a gente do sertão!
É toda coração,
é bondade infinita, é suprema bondade,
Riso, delicadeza, ingenuidade,
Fé, alegria, amor, perdão,
Afeto e caridade.

Vendo alguém padecer, o sertanejo,
Humildemente pobre,
Todas as mágoas do infeliz encobre
Com a carícia de um beijo.

E agora, estas paisagens relembrando,
Sinto, de quando em quando,
Uma vontade enorme de chorar,
E este desejo mais em mim se aferra,
Vendo outro céu, vendo outro sol, vendo outra gente,
Tão diferente,
Da gente boa lá da minha Terra!...


Lucídio Freitas
em POESIA COMPLETA
Teresina: Convênio APL/UFPI (1995)

2.11.11

EVOCAÇÕES, Lucídio Freitas


IV


Têm as águas, aqui, estrondosos e estampidos,
Gritos de dor e gritos de agonia,
O mar, quer seja noite ou seja dia,
Fala somente,
Desumanamente,
A linguagem sombria dos gemidos.

O mar feio, disforme,
Simbolizando o mal, o ódio, a vaidade,
Bem se parece
Com a alma sangrenta e informe
E incalma
Desta grande Cidade,
Que desconhece
O amor - rebento original da alma...

O mar me aterroriza
Com seus rancores e ais incompreendidos
Vendo-o, suponho que ele sintetiza
O pranto amargo dos desiludidos,
Os gestos infernais dos oprimidos
Que a sede e fome morrem sobre a terra,
Porque o mar, no seu bojo ermo e profundo,
Encerra
Todos os sofrimentos deste mundo...
Causam-me horror e medo o barulho do mar.

Quando lhe escuto os uivos,
Levantam-se a tremer os meus cabelos ruivos,
Na alma sinto a correr um frio de gelar...

E ainda diz-me o destino, hediondo, a blasfemar,
Que eu tenho de morrer de um naufrágio no mar...

A Minha Terra... Uns doces movimentos,
Preguiçosos, suaves, sonolentos,
Têm as águas da terra em que nasci...
Jamais as vi
Rebentar em furor indômito de guerra,
Em desesperos e estertores...
As águas mansas lá da minha Terra
Só nos falam de pássaros e flores...

O Parnaíba, ao pôr do sol, encanta
A alma e o olhar.
Ele, claro, a descer, divinamente canta,
Rendilhado de esplêndida beleza,
Levando à flor da correnteza,
A boiar; a boiar.
Ramos de flores de reais matizes,
A epopeia de todos os felizes,
O almo esplendor de nossa Natureza...

Desce, e com o olhar o acompanhamos.
Desce, circula se envolvendo aos ramos
E ao nosso olhar se perde...

E, que saudade sente, e que saudades
Leva da noiva que é a Cidade Verde
- A mais linda de todas as cidade...


Lucídio Freitas
em POESIA COMPLETA
Teresina: Convênio APL/UFPI (1995)