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22.10.18

campeador, Graça Vilhena


era maio na cidade
quando ele chegou de manso
ouviu o rio e as moças
que desciam em correnteza
pro seu peito sonhador

e campeou os desejos
com força de vencedor
sem esquecer a lição
que a terra seca ensinou

ah campeador, campeador
que tem por sina entender
o destino das palavras
e a mulher do seu querer

e nesse teresinar
cresceu o seu amanhã
onde cabem agasalhados
amigos que são irmãos.


Graça Vilhena
Poema-prefácio do livro
Pétalas, uma antologia poética, de Cineas Santos
Oficina da Palavra: Teresina, 2010

23.1.18

Dobal, Graça Vilhena


a lembrança de ti vara o silêncio
no longínquo espaço das ausências

em que taça, poeta, bebes agora as luzes
que desejas?

meu coração é um pássaro
alongando o céu das incertezas

posso supor que onde estás
germinem sóis
e só é possível ser feliz
que possas andar solto
ouvindo conchas, tecendo brisas
para pescar teus novos peixes
ou que os poemas sejam constelações
onde as palavras explodem
na intimidade dos segredos

suponho também
que possas se quiser
ser menino outra vez
e brincar na sala dos espelhos

mas são apenas suposições
de certo sei dos versos que ficaram
no verde campo das eternuras
onde o tempo esquece seus degraus


Graça Vilhena
em PEDRA DE CANTARIA
Teresina, Nova Aliança e Entretextos, 2013

26.12.16

Os ratos, Graça Vilhena


há um lugar
onde moram os ricos
e outro os pobres

porém há um povo
que mora em qualquer lugar
da cidade generosa
com seus chafarizes e sombras
bancos e marquises

dele nada sabe o rico
nem o pobre
só os ratos que engordam
e correm pelos domingos vazios
do centro da cidade


Graça Vilhena
em PEDRA DE CANTARIA
Teresina, Nova Aliança e Entretextos, 2013

5.12.16

Sábados, Graça Vilhena

Para o Prof. Marcílio Rangel de Farias,
in memoriam

os mendigos tinham nomes
as casas muros baixos
e quando os rios alagavam
barrentos de chuva
muitos de nós andávamos pelas ruas
em roupas alvas
passadas de dor
contaminados pelo infortúnio
dos alagados

e assim crescíamos
sem nojo e medo
no tempo em que a cidade
cabia inteira
nos braços de Deus


Graça Vilhena
em PEDRA DE CANTARIA
Teresina, Nova Aliança e Entretextos, 2013

29.12.15

Menino no cais, Graça Vilhena


é uma criança sozinha
no cais vazio de barcas
vejo daqui o seu corpo
que a noite adormeceu
sem pensamentos e abraço

é um menino pequeno
sob o luar ao relento
feito uma flor no sereno


Graça Vilhena
em PEDRA DE CANTARIA
Teresina, Nova Aliança e Entretextos, 2013

2.9.14

Teresina, Graça Vilhena


sobre a ponte do Poti
a cidade vê de frente
seu retrato vertical

para trás ficaram praças
meninos de bicicletas
feiras, danças e cinemas
que ensinavam a namorar

para muito além da ponte
em um canto do futuro
os meninos que hoje crescem
também guardarão no peito
sua cidade esquecida
que dançou em outro tempo
com sua saia estaiada
sobre o rio que secou


Graça Vilhena

11.8.14

O oleiro, Graça Vilhena


um dia viu
no fundo da fornalha
que sua vida secara
entre os potes


em PEDRA DE CANTARIA
Teresina, Nova Aliança e Entretextos, 2013

5.2.12

Cine Rex, Graça Vilhena


Rex
Mentex
007

Os goldfingers
a minissaia
o jeans
o sexo

braços mecânicos
e olhos de eternos diamantes


em P2 
Teresina: Livraria e Editora Corisco Ltda, 2001

29.1.12

O garrafeiro, Graça Vilhena


o garrafeiro era apenas um homem
que sobrava das ruas
também sujo de terra e esquecido
como as garrafas e cacos no quintal

suas mãos de cuidado
tangiam aranhas, lagartixas
e vez por outra
um escorpião afiado

depois arrumava as garrafas
lado a lado
âmbares, azuis, verdes, transparentes,
num arco-íris pobre

"essas são de vinho tinto"
dizia-me ele embriagado de vazios
e as de fundo côncavo serviam
para pescar piabas no Poti

o mundo é duro e frágil, eu aprendia
mas nele lições pequenas eternizam
piabas prateadas nas garrafas
como rútilos presos nos cristais


em PEDRA DE CANTARIA
Teresina, Nova Aliança e Entretextos, 2013

14.12.11

Rua da Glória, Graça Vilhena

para o poeta Paulo Machado

paisagem de sol nascido
na estação do trem
cerzindo os dias
sobre as pedras da rua
que abrolhavam luz

manhãs tangiam beatas
palmolivelmente
para a missa do Amparo

senhoras varriam calçadas
recolhiam leiteiras
e caçavam histórias
com as suas línguas de camaleão

no mercado central
as verdureiras arranjavam
buquês de cheiros-verdes

e mais além
mulheres permaneciam
sem hora de seus dias
dissolvendo-se em transparência
nas escamas do cais


em PEDRA DE CANTARIA
Teresina, Nova Aliança e Entretextos, 2013