22.10.13

O SON(H)O DA CIDADE, Elias Paz e Silva


o sonho da minha cidade
é amarelo
na sua paisagem iluminada
(na pele de seu rio sujo)

o sono da minha cidade
é o sonho do seu povo
que dorme na mesma esperança
de todos os dias


Elias Paz e Silva
via Recanto das Letras

CIDADEZINHA, Elias Paz e Silva


vamos
assistir à televisão na praça,
enquanto o dia bobo não vem.
nem um lobo
pra quebrar a rotina,
nem um beijo
tolo da amada.

vamos
assistir à televisão da praça,
enquanto vamos inventar um lobo,
e uma amada também.
tá pronto?


Elias Paz e Silva
via Recanto das Letras

TER É SINA II, Elias Paz e Silva


cidade sem memória
sol e sombra do nada
sitia os deserdados

                  o fogo o terror nas casas de palha
                  os pedaços da doméstica
                  quarentinha bibelô nicinha

guerra silenciosa e
capital redistribui os espaços
da fome e dá forma à frei serafim

                  os anos fiados em miséria
                  perdidos à sombra do tempo
                  perpetuados à luz do dia
                  fabricados armazenados

teresina: claudino & cia
tajra tajra tajra taJRa tajra tajra

                  à igreja do santo negro
                  submersa em lendas
                  superpõe-se as torres
                  do amparo e a crença dos fiéis

paisagem artificial
se interpõe à brisa libertina
espigões tramam a colheita diária
de calor e cansaço

                  um monumento à morte
                  potycabana anfiarte
                  divisa a linha da vida
                  na miragem das coroas

ao lírico por do sol
avermelhando as cortinas
o rio se dá assoreado fulminado
entre navios sonâmbulos
paruaçu, rio de sonho, salve, salve.

                  um pescador de horizontes
                  senamora sete moças virgens
                  sobre o neon de natal da ponte

pára-raios vigiam o mito
coriscos já não riscam noite
não se pode dizer de lendas
antenas sensíveis decifram céu de enigmas


Elias Paz e Silva
via Recanto das Letras

Elias Paz e Silva - síntese biográfica



Elias Paz e Silva [ ✰ 26/11/1963 ] nasceu em Teresina - PI. Poeta, contista, cronista e jornalista. Bibliografia: Poemário I (1991); Poemário II (1991). Participou dos livros: Poesia Teresinense Hoje (1988); Novos Contos Piauienses (1984); Outros contos piauenses (1986); A Poesia Piauiense no século XX (1995), entre outros.

Memória (Caminhos de Estrelas), de Menezes y Morais




Vênus incendiava teus cabelos naquela noite
em que caminhávamos refletidos nas águas
margens assassinadas do rio poti
e no mangal
eu viajei na constelação dos teus olhos
e te dizia
a vida vai além daquilo q a gente imagina
e a liberdade pode estar ali
na próxima esquina
e sobre os trilhos noturnos
convergendo olhares favelados
com a tua mão esquerda dentro da minha direita
sentimos o fogo estrelar daquela noite azul
no céu de teresina
e o vento soprou leve
sussurrando em tua boca
entre o rio e a cidade existe um caminho
onde o tempo cicatriza toda dor



Menezes y Morais
em A POESIA PIAUIENSE NO SÉCULO XX | Antologia
Organização, introdução e notas por Assis Brasil
Teresina/Rio de Janeiro: FCMC / Imago, 1995


Menezes y Morais - síntese biográfica






José Menezes de Moraes (29/07/1951) nasceu em Altos - PI. Poeta, contista, jornalista e professor. Licenciado em História. Bibliografia: Laranja partida ao meio (1978); O suicídio da Terra; Pássaros da terra com paisagens humanas (1982), entre outros; Participou do livros: Tudo é melhor que nada (1974); Ô de casa (1977); Aviso prévio (1977), entre outros.


HOMENS DE BRONZE, por Rubervam Du Nascimento




por que esse homem
vestido de bronze
na avenida central
em pleno meio-dia
não reclama de nada
sequer do calor do sol

o que ele olha
algum esqueleto no céu
não sabe ao certo
cegou antes
ao aceitar o posto
de vigia da noite

não me pergunte
o que eu acho
dos donos desta cidade
vestidos de bronze
que não mais se movem
nem para fugir do sol



Rubervam Du Nascimento
em TERESINA: Um Olhar Poético
Teresina: FCMC, 2010
Organização de Salgado Maranhão


O GUARDADOR DE PORTÕES, por Rubervam Du Nascimento



Numa cidade qualquer
alguém vestindo preto segura os portões
uma história sem nenhum pavor
se uma cidade ainda tem portões

Durante a noite alguém voa por cima das igrejas velhas
por cima das casas velhas
por cima das cadeias velhas
por cima das escolas velhas
por cima dos cabarés velhos
por cima de tudo

                Tudo é velho
como uma sombra escondendo a manhã

apenas um grito novo
se resguarda

e solta a porta das palavras.



Rubervam Du Nascimento
Antologia poética das cidades brasileiras
Christina Oiticica (coordenadora)
Shogun editora e arte LTDA.: Rio de Janeiro, 1986


P2, por Rubervam Du Nascimento


Há uma praça
no centro da cidade

que fica acesa
quando engole a tarde

reparte seus fantasmas
com quem passa

namora em silêncio
os segredos do tempo

sobe no coreto
ouve a retreta

dorme no colo
em "P2" (livro sobre a Praça Pedro II)
Teresina: Livraria e Editora Corisco Ltda, 2001


RASTROS #3, por Rubervam Du Nascimento



manhã raivosa no jornal
menino filho da rua
degolou outro menino
por causa de uma bola

silêncio na cidade
égua cega no cio
sem sair do sobrado
venceu jogo no grito

não tem jeito a morte
continua com a face fria
grave mal o abandono
que aflige nossos dias



Rubervam Du Nascimento
em Os cavalos de Dom Ruffato
Recife: Fundação de cultura da cidade do Recife, 2005


Rubervam Du Nascimento - síntese biográfica





Rubervam Maciel do Nascimento  (31/07/1954) nasceu em São Luís - MA. Formado em direito, poeta. Tem publicado: A profissão dos peixes; Os cavalos de Dom Rufatto; entre outros. Fotografia: Rubervam, em sua performance Corpo a corpo – A profissão dos peixesno Alpha, em 18.7.1993.

21.10.13

SR. CORNÉLIO



Cornélio Evangelista da Costa, o Sr. Cornélio, que completa 90 anos no próximo dia 28 de agosto, disse que não tem saudades de tempos atrás. "Gosto da Zona Leste de Teresina pelos seus arranha-céus", afirma. Há quarenta anos, ele se instaurou no ponto mais badalado do centro da cidade, a esquina da Praça Pedro II com a Avenida Antonino Freire, a menor avenida do mundo, construída para homenagear o governador do estado entre 1910 e 1912. O cardápio ainda é o mesmo: pão de queijo e refrigerante. Ele mesmo cuida da lanchonete até hoje. É um observador do seu tempo e diz que até os costumes mudaram. "Uma coisa interessante, os homens circulavam o coreto da Praça Pedro II pela direita e as mulheres, pela esquerda, era assim que se paqueravam. Se você fosse deixar a moça na casa dela, era casamento feito", revela. Ex-vizinho de figuras ilustres como os governadores Helvídio Nunes e Leônidas Melo, ele relembra que a atual area nobre da cidade, a zona leste, era um local de veraneio, onde os comerciantes do centro mantinham sítios para passar o final de semana. "As pessoas mais ricas da cidade moravam na Avenida Antonino Freire e na Avenida Frei Serafim", lembra. Natural de São João dos Patos "MA", Sr. Cornélio ficou viúvo às vesperas de completar bodas de ouro. "Foi amor a primeira vista. Tenho três filhos, cinco netos e dois bisnetos", disse. Sr. Cornélio não tem planos de parar. Todos os dias, o forno da lanchonete Mary Lucy assa mais de cem pães de queijo que são consumidos ainda quentes.



Revista Veja 
Edição 2229 
Ano 44 - nº 32, em 10 de agosto de 2011

20.10.13

TERESINA DO MEU CALOR




Quis fazer uma ode ao calor
Ó amigos, por favor
não confundas
com ódio ao calor.

Ao nosso calor abrasador
acolhedor
que pelo BRO passou
e em janeiro penetrou.

Claro que nos faz insônia
que nos incomoda
que nos deixa acordados
noutro dia extenuados.

Calor que exige
mini-saia, mini-blusa
tudo miniminha
até mini-calcinha.

Calor que acaba camisa
bem debaixo do sovaco
calor que nos faz achar
Teresina um buraco.

Calor até onde existe
o tal ar refrigerado
vide, vide o aeroporto
que é melhor atestado.

Calor pra tudo que é lado
calor pra cima e pra baixo
E só nos clubes sociais
E que frescura eu acho.

Teresina, menina quente
incrementada, pra frente,
Teresina do meu amor
Teresina o meu calor.



Deusdeth Nunes
em Revista Cirandinha, nº 2 
Teresina: 1978

ROQUE MOREIRA




Ele era a cara da Rádio Pioneira. Cearense, com quase trinta anos no prefixo da emissora católica, resistiu a todas as mudanças de programação. "Seu gôsto na Berlinda e as mensagens para o interior" eram marcas registradas Roque Moreira. Falecido em 94, deixou muitas lembranças aos ouvintes. Eis algumas das mensagens:

"Atenção Andirobal dos Crentes, interior do Maranhão, este aviso é para dona Duó. Seu Mundico Rolo avisa que a canoa virou e o fumo molhou".

"Atenção, atenção, Olho Dágua das Cunhãs, interior do Maranhão, este aviso é para seu Dos Anjos. Dona Santinha manda avisar que a Maria Virgens fez exame e graças a Deus, não é nada daquilo que o povo anda falando".

"Atenção, atenção seu Zeca Domiciano conhecido como Zeca Doca Mole, sua mulher Luzia avisa que não fez o exame porque o doutor queria mexer lá dentro e ela disse que não gostava de saliência. Vai procurar uma doutora mulher".

"Atenção, atenção Oscar Rodrigues Pereira, seu Oscarzinho, do município de Parnarama, Maranhão. Sua mulher, Sinhá Joana avisa que você venha logo com aquele saco de couro porque ela recebeu o dinheiro da aposentadoria e comprou um bilhete premiado e tá com medo de ir  receber o dinheiro sozinha porque pode o povo roubar ela".

Favor quem ouvir este aviso retransmiti-lo ao destinatário.
em Rádio Calçada
Teresina: 1995

APARECEU UMA COCEIRA, por Deusdeth Nunes




Lá no Conjunto Saci
coça mulher e menino
coça lá e coça ali
e a coceira já chegou
lá no Parque Piauí

Tem uns que coçam a cabeça
tem outros que coçam o pé
A mulher coça o homem
o homem coça a mulher
a coceira foi andando
já chegou no Itararé

Meu compadre Chico Tripa
homem de educação
foi coçar dona Josefa
amigada com Borjão
que chegou e deu o flagra
no conjunto Redenção

A coceira anda muito
ninguém segue sua pista
ela gosta da Cohab
que é economia mista
já vi nego se coçando
no conjunto Bela Vista

A coceira está aí
a origem não se explica
ela dá em gente pobre
e também em gente rica
porque tem muito barão
se agarrando com curica.

Observação: Na década de 70 uma praga
de micose atacou a população do Saci



Deusdeth Nunes
em Rádio Calçada
Teresina: 1995