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5.4.20

Os vareiros do Rio Parnaíba, tema esquecido pelo Piauí, por Jorge Baleeiro de Lacerda


Em 1977, durante uma semana, estive em Parnaíba, Piauí, a que voltei outras vezes. Dessa feita, uma das figuras que conheci e com quem fui à Pedra do Sal foi o jornalista e escritor Raymundo de Souza Lima, que estudava os vareiros, os porcos-dágua, no dizer popular, do Rio Parnaíba, homens que passavam, com varões de até oito metros, as embarcações que faziam o trecho entre Terezina e Parnaíba, no tempo áureo da carnaúba, do babaçu e do couro.

Raymundo de Souza Lima, na praia da Pedra do Sal, costa do Piauí em janeiro de 1977

Até hoje, o Piauí ainda não publicou uma obra de peso sobre os vareiros, embora M Paulo Nunes, do Conselho Estadual de Cultura, tenha se dedicado muito a temas piauienses em sua revista Presença, publicada pelo CEC.

Lembro-me do carinho com que Raymundo de Souza Lima tratava o tema, que conhecia tão bem por tê-lo vivenciado nos anos 30 e 40.

No clássico Beira-Rio Beira-Vida, de Assis Brasil, o tema não é abordado, apenas faz referências. O assunto central é a prostituição, vida mundana à beira do rio que banha a cidade de Parnaíba.


Recentemente sugeri ao deputado federal Hugo Napoleão (que não foi reeleito, interrompendo 40 anos de vida pública) que publicasse pelo seu gabinete um livro ou uma plaquette sobre os vareiros do Rio Parnaíba, mas acho que não apareceu ninguém interessado em abordar o tema nem foram achados os apontamentos de Souza Lima.

Quando vivo, perguntei a Fontes Ibiapina, um dos mais notáveis escritores, por que não abordava o tema. Disse-me que lhe faltava experiência ribeirinha, convívio com o Vello Monge (o Parnaíba). Era do interior do Piauí, não da beira do rio, daí o seu desinteresse pelos vareiros, mas não descartava a possibilidade de uma dia escrever. Não teve tempo.


Oxalá a Prefeitura de Parnaíba e seus amigos da extinta Folha do Litoral, do saudoso Batista Leão, achem o manuscrito de Os Vareiros do Rio Parnaíba para que a cultura do Piauí ganhe esse estudo sobre um dos tipos mais tradicionais, hoje esquecido, pelo conselho de cultura do Estado de Da Costa e Silva. Fica o lembrete para Cineas SantosM Paulo Nunes, baluartes da cultura na velha Chapada do Corisco.


Jorge Baleeiro de Lacerda
Coluna BRASILIDADE PARANISMO SUDOESTE
Publicado originalmente em 31/01/2015 08:45, via

18.3.20

BAIÃO DE TODOS: poetas repensam a vida, num diálogo civilizatório, por Menezes y Morais




O poeta William Carlos William (1883-1964) assegura: “Os poetas enxergam com os olhos dos anjos”. Poeta, criador de Arte, é construtor, lapidador de civilização, nos assegura o conceito antropológico de cultura. Os 48 poetas reunidos em Baião de Todos (poesia, 2016) mostram isto em seus discursos poéticos.

A dicção poética questiona e repensa a Vida. Os poetas dialogam entre si, questionam a civilização, repensam a Poesia, a sociedade, o País, o mundo. O diálogo entre poetas, a reflexão sobre a sociedade moderna, o engajamento político, são temáticas perenes entre os Poetas dignos deste nome.

A Poesia não é feita apenas palavras – para lembrar os poetas Stefane Mallarmé e Paul Valéry, no final do século XIX e início do século XX – mas, sim, de palavras com significados e significantes – para lembrar São Tomás de Aquino, in Confissões (sua biografia, escrita por volta do ano 400 da nossa era).

TEMA TABU?

A segunda metade do século XX provou que se faz Poesia sem palavras. Neste surpreendente século XXI a Poesia parece regressar exclusivamente à carpintaria da palavra, depois que todas as vanguardas ficaram datadas, como, por exemplo, entre nós, a Poesia Concreta, Neoconcreta, Poesia Práxis.

No retorno à palavra, a Poesia também é feita de ideias (sem cair no panfletismo), de propostas lúdicas, de críticas civilizatórias, gritando alto ou sussurrando (em suas imagens e metáforas) em nome da Vida: todos os temas cabem no poema. Da dor ao prazer, da civilização à barbárie. Enfim: o Poeta fala de Poesia, da sua e da nossa humanidade.

UM POUCO DE CADA UM

Baião de Todos (2016) começa com Adriano Lobão Aragão, que remete o leitor às Sagradas Escrituras: “Estando Ruth posta em tormento em meio ao trigo alheio”, num poema de suave beleza estética. Aragão também é blogueiro.

Na sequência, Alcenor Candeira Filho, que o tempo consagrou mestre do fazer poético, em minha opinião. Sua temática vai do metapoema (Teoria do Poema), à morte, à vida, se revelando em plena maturidade estética. Depois, a jornalista Ananda Sampaio, de que nos ficou as imagens:

“Horas que acumulam dias”, “Roendo um dia/ que não quer acabar”, e “O homem clama por um sinal divino”. Ananda também nos remete à Bíblia – “aquele preso dentro da baleia”, (o profeta rebelde Jonas). A poeta fecha com Náufrago, um poema perfeito.

RUA DO POETA

Na sequência, Caio Negreiros. Ele tem, entre outros, um livro com um bom título (A Decadência das Horas). Caio também é fotógrafo. O poema dele não tem título, mas uma imagem bonita – “uma gota de sol” – e ao final acena à solidão urbana e universal, remetendo o leitor ao poeta Carlos Drummond de Andrade – “não é rima ou solução”. Da poeta Carmen Gonzáles, nos sensibilizou o poema Estrela Guia.

Carvalho Neto, outro poeta esteticamente amadurecido – também é odontólogo e letrista – salpica o tema “rua”, ofertando imagens como “amor inquilino”, “minha rua é do tamanho da saudade”, “minha rua, universo de dor contida”, para desaguar no poema Estação: “na velha estação, aguardo / o bilhete desbotado/ da viagem que não fiz”. Meu amigo Carvalho Neto é um poeta que publica com regularidade.

ALÉM-FRONTEIRA

O poeta seguinte é Chico Castro, também professor, ensaísta e historiador. Chico Castro tem dois belos poemas que se somam ao enriquecimento estético de Baião de Todos: Dallas para que te quero, e Trapo Chique. Além de Chico Castro, um nome conhecido nacionalmente, a letra C tem mais nomes da literatura piauiense que ultrapassaram as fronteiras (literárias) nordestinas. Por exemplo, Cineas Santos.

São de Cineas os poemas Desobediência Civil, Consulta, Convalescença e a obra-prima Poema Inevitável. São poemas dignos deste nome. Deixaram em mim as imagens: “Meu pai me queria lavrador / adubo na semente do seu chão (...) eu queria ser o vento/ pra bolinar o teu corpo”. “A linha principal não leva a nada/ (...) esta linha transversa me leva a você”. “Há muito não se houve meu uivo lancinante/ varando a madrugada”.

Climério Ferreira é outro nome nacional. Ele brinda o leitor com os poemas Pássaro Perdido, Eu sou meu próprio universo, e O Choro da História. Climério (Cli, assim o chamava a eterna Nara Leão) também é compositor, cantor, letrista e professor. O Brasil agradece.

SURPRESAS 

Uma surpresa para mim, entre os poetas piauienses que ainda não conheço pessoalmente, é a cantora, compositora, produtora cultural, Cláudia Simone: fala em “colchão de sonhos”, indaga “Quem foi que masturbou minha inocência?” E afirma: “A vida se encarregou de mostrar / que o amor nunca acaba onde deveria estar”.

Cyntia Osório encerra o índice da letra C. Dela, me ficaram as imagens: “Passeei pelo labirinto do tédio”, no “andar de quem tem asas”, “Existir é infinito”, imagens que marcam Penduricalho, um belo poema. Outra imagem de Cyntia Osório: “5 mg de desejos brancos para o cansaço”. A poeta também nos brinda com o belo Deslugar.

Outra surpresa é Demetrios Galvão, professor e historiador. Recanto é um poema perfeito. Em cine-mirante ficou-me a imagem “um olho filmando tudo”.

Em tempo: ganhei (como diria mestre Manuel Bandeira) o poema Cinema do Olho, musicado por Carlos Bivar Eduardo, com o qual fomos contemplados com um Prêmio SESC de Música 2007.

Demetrios Galvão nos brinda ainda com imagens como “liturgia de campo arrasado”, “exporta desertos”. O poema “a previsão do tempo é uma falácia” é um dos melhores deste Baião de Todos.

SEM GORGULHO

A letra D encerra com Diego Mendes Sousa, poeta da nova geração que usa as redes sociais para divulgar a literatura brasileira. Tinteiros de Mágoa é um poema perfeito, dividido com os títulos de tinteiros: da angústia; dos desertos, e do estranhamento. Evoé, Diego!

Ednólia Fonteles é outra poeta que se me revela em plena maturidade estética. Baião de Todos tem quatro poemas dela numerados com o título Quase Poema, um metapoema perfeito, sem gorgulho. Ednólia Fonteles deve ter um balaio de poesia inédita. Beijo, Ednólia.

Do amigo poeta Elias Paz e Silva ficaram-me a imagem “minha mão escreve / (no esgoto da cidade) / um poema tão grande / como a esperança”. E no poema Proposta, também sem gorgulho: “O dia foi duro amor / mas valia o suor da labuta / e a proposta de outro sol / como desculpa”. Lindaço, Elias.

NEGRITUDE

O também professor, o poeta e meu amigo Elio Ferreira traz o universo africano da “América Negra”. Tem o seu excelente (recitado por ele, com jogo de cintura e dicção bibopeana e onomatopaica) Abracadabra, de cujas imagens, fortíssimas, seleciono: “meu corpo apodrecendo no esgoto”, “meu corpo apodrecendo a céu aberto”, “você quer me ver no lixo”, e “teu corpo apodrecendo numa vitrine virim”.

O também juiz de direito Elmar Carvalho, meu amigo, nos oferece A Ero Moça, Noturno em Campo Maior, Perdição, e Sex-Appeal. Elmar Carvalho é fiel à proposta dos modernistas de 1922: precisamos conhecer o Brasil (no caso dele, o Piauí, Campo Maior, onde nasceu). H. Dobal, que também fixou paisagens campo-maionenses.

O meu amigo jornalista, poeta e professor Emerson Araújo é vida que segue: nos fala de “metáfora de plantão” (poema Novo Achado), faz metapoesia (Nova poética) e desagua em Junho em meu oficio, que me parece um poema sem gorgulho. Emerson tem vários livros publicados, entre os quais Címbalos, lutas e olhares (poesia, 2015).

Na nova safra de poetas está Ernâni Getirana, mistura o substantivo belicoso “guerrilha” (que seduziu muita gente boa no século XX) com o metapoema de Drummond (“lutar com palavras / é a luta mais vã...) no poema (es) talo, e nos apresenta Encontro, um poemeto perfeito.

GERALDO BORGES

O poeta Fernando Ferraz homenageia Cineas Santos in “Poesia como alimento”. Ele também nos brinda com duas pérolas poéticas: Ipês de Maria, e Teus Olhos. Depois dele, surge o também contista, cronista e historiador Geraldo Borges, outro escritor que se encontra em plena maturidade estética.

Os quatro poemas de Geraldo Borges também são termômetros da qualidade estética da coletânea: Viagem, Rio 1, 2 e 3 (sonetos). Nas quatro peças poéticas, Geraldo Borges transfigura lembranças de infância, e louva o nosso mítico, querido, maltratado (porém amado pelos poetas) rio Parnaíba.

Do também compositor (premiado) Glauco Luz nos ficou a lembrança de Carlos Drummond de Andrade in Dicotomia. Nele, o poeta Glauco oferta a imagem que se destaca – “socos do desalento”, além duma reflexão sobre a palavra (Palavra suja) e o melhor dele, em minha opinião, Poeira de Estrelas.

BISCOITO FINO

Contista e professora, Graça Vilhena nos brinda com quatro “biscoitos finos”, (diria Oswald de Andrade) da sua “oficina da palavra” (apud Cineas Santos): Poesia; Rua da Glória (ao Paulo Machado); O Garrafeiro (para Cineas Santos) e Carpete de Cordas. Graça Vilhena tematiza a Poesia e duas paisagens, geográfica e humana – no poema Garrafeiro.

Ficaram em mim as imagens: “Cerzindo os dias”, “pescar piabas no Poti”, “piabas prateadas nas garrafas”, “aquele instante que o tempo não deixa envelhecer” e “os dias são feitos de um longo esquecer”. Graça Vilhena é uma das melhores poetas brasileiras.

Admiro ainda sua parceria poética com William Melo Soares, no belo e clássico Passo a Pássaro (poesia, s. d), que tem capa de Paulo Moura, apresentação de Cineas Santos, de Rubervan Du Nascimento, e posfácio de Héctor Pellizzi.

Em tempo: aonde anda Héctor Pellizzi? Ele escreveu um miniensaio sobre o meu livro O Suicídio da Mãe Terra (contos, 1980), que eu vou publicar na segunda edição.

CAMINHO CRUZADO

Halan Silva vem na sequência, homenageia Charles Baudelaire, com a tradução do poema Remorso Póstumo. Mas, o poema sem título, em três partes, de Halan Silva, em Baião de Todos, é melhor que o traduzido do poeta francês. Que me perdoe o genial Baudelaire.

A poeta seguinte é Jasmine Malta. Arte-educadora, entre outras prendas, Jasmine faz Teresina de musa num poema, fala do calor e das “antigas lavadeiras”, que decoram a paisagem fluvial da Cidade Verde (ainda é?), que virou metrópole de concreto na passagem do século XX para o XXI.

Time is time é belo. Jasmine confessa noutro: “Eu gosto de homem que tem cheiro de homem.” / “O Homem que desconcerta os passos /quando cruza meu caminho”.

João Batista sequencia com quatro poemas: olhadela; vovó lavadeira, e enguias. O quarto, dias de brisa, tem um verso sublime: “a doçura de outros quintais”. E por falar em quintais, os quintais de Teresina do meu tempo desapareceram, as casas antigas foram demolidas e os quintais se transformaram em estacionamento. Concretados.

De João Batista sublinho ainda as imagens “o marulho dos teus olhos”, “coisa que o vento aluga e leva”, e “sem a pressa do repouso”. João Batista é um poeta atuante, produtor cultural e professor.


O alfabeto continua em movimento in Baião de Todos. Keula Araújo é a sequência. Organizou a coletânea com Cineas Santos. Keula também é professora e arquiteta. Dos seus poemas destaco o belo Do Amor, tem imagens como “sob o sol imorredouro/ da vontade”.

Para a poeta, o amor destrói os cárceres. Cantigas do Sem-Fim é um poema prenhe de ternura/ imagens – “jeito desarrumado /do jeito de respirar”, “um amor cru, mal passado/que não foi, nunca será”.

Teu Reino tem um verso para mim comovente: “Rompi com as horas / trespassadas de espera”. Keula Araújo é surpresa comovente entre os poetas piauienses que eu ainda não conheço pessoalmente.


O poeta seguinte é Kilito Trindade, vive hoje em Brasília. Ele também é produtor cultural e meu amigo. Kilito Trindade, uma doçura de ser humano.

In Baião de Todos Kilito Trindade publicou um poema sem título (ou dois?) que contextualiza “Eu bala perdida”, e o segundo “Apalavra chave desapareceu. A palavra (chave) AMOR”.

Também dele os poemas Anima, seguido doutro destitulado, que louva Guimarães Rosa: “É preciso sofrer depois de ter sofrido, / e amar, e mais amar, depois de ter amado”. Kilito é uma das realizações das promessas poéticas. Recita bem, à risca, no pulsar do planeTerra.

O poeta seguinte é Laerte Magalhães, também professor, tem quatro livros publicados. Dos seus poemas de Laerte destaco: Oração, e Das Dores, têm dicção bem humorada, de apelo ao imaginário auditivo. Os demais – Percussão, e Puta Poeta – tematizam a música, a dança. Eros é convocado.

SONETOS

Lara Matos dá continuidade, duma dicção poética de visão de mundo afiada, um olhar consciente na ponta da língua. Publicou os poemas Riscos, Mancha, e Ofélia.

Diz ela, poderosa: “Mas minha linha de vida curvada / como minhas costas / pela tenacidade dos sem-sorte/ recita uma canção há muito sabida”. E “Amo tanto que as palavras/ faltam/ Meu corpo cansado apenas / sussurra uma cantiga”... Evoé, Lara Matos.

O poeta-médico Leandro Fernandes é a sequência, com Soneto da Saudade, que se destaca entre o também soneto Chapada do Araripe, e o poema Cantiga.

BICICLETAR

Outra surpresa é Lívia Maria, 17 primaveras. Tem muito feijão-com-arroz pela frente. Entre outras observações que podem acontecer, destaco:

“Amar é ter uma bicicleta / mesmo morando no primeiro andar”, criticando “o amante visionário / embriagado pelo vinho da nudez e da loucura” Para Lívia Maria. “o poema é um vazio / no rosto indignado do poeta”. Vamos que vamos, Lívia.

Lucas Rolim é a continuidade, com os poemas o grande leão, louva-deus sobre a folha. o lobo, os caneleiros, a formiga e Terrários. Machado Júnior é o próximo, ele também é compositor, músico e publicitário. São dele os poemas Dom Quixote (para Flávio de Castro, in memoriam), Fé, Bela, e De Tudo um Tanto.

MARLEIDE LINS

Minha amiga Marleide Lins é a sequência alfabética. Também editora, vários livros publicados aqui e no exterior. Lirismo Antropofágico e Estações de Mim a meu ver sem gorgulho. Dor dos Deuses é seu terceiro trabalho nesta edição. A poeta Marleide está na 1ª edição de Baião de Todos, livro que a Avante Garde assina a programação visual.

Continuando a letra M, depois de Menezes y Morais - José Menezes de Morais - (não vou falar de mim mesmo), que publica o poema Domicilio Inviolável (pequeno elogio da rebeldia musical), entra em cena Nelson Nunes, com os poemas dignos deste nome – A miséria abunda, Na terra do sol, e Clarice. Nelson Nunes é advogado, tem vários livros de poesia publicados.

PAULOS

Quem aparece depois é o também professor, pesquisador, letrista, jornalista premiado Paulo José Cunha, meu amigo, com os poemas (dignos deste nome) Substâncias, Moto perpétuo (para Paulo Cunha, neto), Agora, e Chegue: “Apenas chegue/ e diga alguma coisa em meu ouvido/ como se nunca tivesse saído”.

Paulo Machado é o poeta seguinte: defensor público, historiador e contista. Assina in Baião de Todos os poemas Canção de Amor e Morte, O Rio (para o poeta Cineas Santos), e Cotidiano 2 (para Durvalino Filho). Nutro ternura e admiração por Paulo Machado, morei um tempo no mesmo bairro dele em Teresina, cidade que o poeta também transformou em musa, com belos poemas sobre algumas de suas.

Paulo Machado tem dois livros que considero pequenas obras-primas: Tá pronto seu Lobo, e A paz do pântano. Na sequência da letra P, o poeta meu amigo Paulo Moura, também chargista, compositor, designe gráfico, parceiro do meu compadre querido Cineas Santos no livro Aldeia Grande (1992).

Lembro-me dum bate-papo acervejado que eu e Paulo Moura travamos, numa mesa de bar em Teresina, ele criticando uma canção dos Beatles (Here comes the sun, de George Harrison), falando mal da letra – “arte pela arte” – e eu defendendo a declaração de amor à natureza: “Aqui chega o sol”.

Paulo Tabatinga encerra a letra P. É da nova geração de poetas piauienses que ainda não apertei a mão. Dia Claro, Meu poema, Província submersa e Crachá liberal são poemas poderosos. O olhar crítico do poeta sobre o cotidiano humano e geográfico também transborda ternura. Aleluia!


Rodrigo M Leite é outro nome da nova geração de poetas piauienses. Ele usa o formato fanzine e as redes sociais para divulgar Poesia. Dele e de outros poetas. Ainda não o conheço pessoalmente, só via e-mail, mas aprendi a admirá-lo, por esta e a qualidade estética do seu trabalho.

Rodrigo M Leite edita um blog, a musa esquecida, no qual resgata poemas que têm a Capital piauiense como tema. In Baião de Todos, tocou-me os poemas a casa rupestre (“a casa é centenária / mas está viva/ e / comunica perguntas / ao morador”) e café art bar, do qual cito estes versos: “da tarde que segue nervosa / homens surgem suados / carregados de preocupações / a tarde é consumida dentro de um café”).


Encerra a letra R, Rubervan Du Nascimento, poeta premiado, meu amigo, do qual também sinto saudade das nossas conversas, dos nossos agitos culturais (paralelos) com F. Eduardo Lopes, William Melo Soares, Miguel Soares (Jorbacilomar), os saudosos Josemar da Silva Neres, o poeta Zé Magão etc.

Rubervan Du Nascimento também rompeu as fronteiras nordestinas. Tem quatro livros publicados, entre os quais A Profissão dos Peixes (poesia, 1993). Ele migrou do Maranhão para Teresina, e, da musa tórrida advir (com licença de Mário Faustino) retirou para São Paulo. Rubervan nos presenteia com 4 Poemas Dispersos, dos quais me perseguem as imagens “ferida dos dias”, “na boca em êxtase”, e “da janela dos dentes”, para falar de cenas bucólicas, urbanas, briga de casais etc.


O meu amigo-irmão, compadre-poeta e letrista José Salgado Maranhão, equilibrista da vida, vem em seguida. É outro nome nacional (e de dimensão internacional) que enriquece esteticamente Baião de Dois. Nele, o poeta-protagonista com sua envolvente dicção, plena da sua peculiar atmosfera misteriosa, me perseguem imagens:

“Oráculo de atabaque e pergaminho”, “arrimo de vozes no lugar das unhas”, “feito um caju que apodrece/mas a castanha resiste’ (genial). Salgado também é coleciona prêmios literários – Jabuti, Academia Brasileira de Letras. Salve, salve poeta. Que lhe venham outras láureas.

Baião de Todos me apresentou Thiago E, também é músico e professor. Tem livro publicado e CD gravado. Dele, se cristalizaram em mim as imagens poéticas “a língua é um molusco, já não sabe se é carne ou um soluço – sem concha, se reinventa no escuro”, e “o mar sempre guarda um jardim dentro do bolso”.

PAREDES DO VERSO

Na letra V, Vagner Ribeiro nos remete a Virgílio, pela voz de Fernando Pessoa (“viver não é preciso” e também homenageia Guimarães Rosa, citando o clássico Grande Sertão: Veredas. A sequência é a artista plástica, professora, contista e poeta Vanessa Trajano. Ela surpreendeu-me com o poema Impronunciável. Perfeito, sem gorgulho.

De Vanessa Trajano também me sensibilizaram as imagens “tem horas que até o impulso é tarde”, “nas paredes do verso”, “amei cinco homens sem retorno”, “o poema permanece in vitro” e “na angústia dessa busca”.


O último autor deste Baião de Todos é o meu amigo-irmão William Melo Soares, um dos melhores poetas brasileiros da nossa geração. Wiliam nos presenteia com as pérolas pedra de fogo, Insônia, e Indomáveis. Também letrista, William tem vários livros publicados. Confessa que o seu tempo “é pedra de fogo”, que a mariposa “me dá lição de silêncio”, “no vasto campo da fala”.

Além da sua poesia em si, o flagrante delito autoral que ilumina de ternura e civilidade, William, a meu ver, é uma personificação do ser Poeta. Pela sua sabedoria quase ingênua, pela sua simplicidade, pela sua humildade, pela intuição e leveza. Explico melhor.

Cito dois exemplos históricos, envolvendo quatro poetas: para Carlos Drummond de Andrade, a materialização do poeta era Vinicius de Moraes. Para Mário Quintana, a personificação do poeta era Cecília Meireles. É claro que existem muitos poetas (de geração e geração) que se enquadram neste perfil.

William Melo Soares é um deles. Graças a Deus.

(...)



Menezes y Morais [Poeta, escritor, professor, jornalista e historiador piauiense. 12 livros publicados (mais 12 na gaveta), entre os quais o romance A Íris do Olho da Noite (Thesaurus), Por Favor, Dirija-se a Outro Guichê (teatro em um ato), na Micropiscina da Lágrima Feliz (poesia), A Luta é de Todos – História do controle dos gastos públicos no Brasil (Unacon), com Teresinha Pantoja] Via blogue do poeta Emerson Araújo



22.10.18

campeador, Graça Vilhena


era maio na cidade
quando ele chegou de manso
ouviu o rio e as moças
que desciam em correnteza
pro seu peito sonhador

e campeou os desejos
com força de vencedor
sem esquecer a lição
que a terra seca ensinou

ah campeador, campeador
que tem por sina entender
o destino das palavras
e a mulher do seu querer

e nesse teresinar
cresceu o seu amanhã
onde cabem agasalhados
amigos que são irmãos.


Graça Vilhena
Poema-prefácio do livro
Pétalas, uma antologia poética, de Cineas Santos
Oficina da Palavra: Teresina, 2010

19.10.18

Baião de Todos - Edição comemorativa de 20 anos, por Geraldo Borges



Há três opções para uma leitura da antologia "Baião de Todos", editada pela FUNDAPI, e organizada por Cineas Santos e Keula Araujo (Teresina - PI, 2016).

A primeira seria aleatoriamente, abrindo aqui e ali, uma página do autor que chamasse atenção do leitor, por simpatia, ou, mesmo, por preferência de estilo, titulo e tema; e saboreando ao seu bel prazer, até mesmo por que a antologia é um leque de várias cores temáticas, um mergulho nas profundezas da alma dos poetas na luta com a inspiração.

A segunda leitura seria a linear, quer dizer, a forma em que o livro foi montado. Ordem alfabética de A W, terminando com o William Soares, o consagrado poeta de nossa cidade e que vive levitando pelas ruas com o seus passos em câmara lenta.

A terceira leitura seria em ordem cronológica, o que poderia muito bem explicitar os estágios da poesia brasileira de expressão piauiense. Claro que esta leitura não é possível, já que a antologia não foi organizada em ordem cronológica. Mas, pensando bem, as sintéticas informações biográficas, em parte, ajudam bastante ao leitor que se propõe a estudar com mais empenho a nossa literatura.

Quanto a ilustração a capa do meu amigo Amaral é muito bonita. Uma revoada de pássaros. Poesia. Mas não reflete o miolo da antologia, que, no meu entender, é a contradição do novo na luta contra o antigo. A não ser que a revoada de passarinhos signifique um bando de poetas perplexos em sua cidade sitiada.

Quanto a qualidade da antologia Baião de Todos é um bom prato, pena não ter aparecido mais convidados. A gente ler e fica lambendo os beiços. Tem sabor para todos os paladares, os mais bizarros e esquisitos. Os poetas surpreendem, tanto os mais novos como os mais antigos. Uma das características dos poetas é cantar a sua terra. Celebrar a sua aldeia. E o que tem de sobra em Baião de Todos. Vejamos. Graça Vilhena:

"No mercado central
As verdureiras arranjavam
Buquês de cheiro verde"

Os exemplos são muitos, o leitor pode conferir no livro. Os poetas mais antigos falam de uma velha província, que jamais será restaurada a não ser na memória e imaginação dos poetas. Os poetas mais novos, que cresceram dentro de um cenário de uma cidade em transição, que se verticalizou em concreto, cantam sua cidade dentro de outro compasso. Uma cidade estilhaçada por contradições. Contradições bem colocadas como se pode ler nos versos de Lívia Maria;

"Amar é ter uma bicicleta
mesmo morando no terceiro andar
E sentir uma euforia quando tudo é cansaço"

Exemplar. A bicicleta é o novo instrumento da modernidade que terão de enfrentar os novos poetas do Baião de Todos. A maioria não acredita mais em musa, essa velha puta romântica. Por isso mesmo terão que pedalar muito e sentir euforia quando tudo é cansaço. Porque sem alegria e estudo não existe inspiração.


Geraldo Borges
Sobre "Baião de Todos",

22.10.16

AINDA TERESINA, Cineas Santos


Para Paula Danielle


Ainda não é uma cidade grande, graças a Deus! Ainda há quintais, mangueiras, passarinhos e meninos para persegui-los. Ainda se vêem pipas bailando no azul das tardes de maio e, nas manhãs de agosto, ipês derramam ouro nas calçadas. Ainda persiste o costume da cadeira na calçada e aquela conversa espichada de quem espera a brisa que ficou de vir lá do litoral. O Mercado Central, com o seu cheiro inconfundível, resiste. Lá é possível comer uma autêntica dobradinha, tomar uma talagada de cana com casca de angico, consultar um raizeiro ou "tirar um retrato" no lambe-lambe. Um pouco mais adiante, impera o Troca-Troca onde, com paciência e muita lábia, pode trocar-se quase tudo, inclusive uma de 40 por duas de 20, desde que entrem alguns caraminguás na transação.

A cidade ainda é reconhecível apesar dos esforços dos que tentam, a todo custo, desfigurá-la. Ainda existem os rios e os que vivem dos rios: pescadores, lavadeiras, canoeiros. No Encontro das Águas, por alguns centavos, meninos entanguidos recontam, à sua maneira, a lenda do Cabeça de Cuia, nunca esquecendo de trocar o verbo comer por devorar. Segundo eles, "comer virgem é prosa". Ainda persistem, nos subúrbios, práticas bem nossas como a de afixar na parede frontal da bodeguinha a placa: É AQUI O FULANO. A simples menção do nome do proprietário é uma espécie de garantia da qualidade do que se vende ali. Nos letreiros das fachadas, escancara-se a megalomania enrustida: há "reis" para todos os gostos. REI DO FRANGO, REI DOS FREIOS, REI DOS ESTOFADOS, REI DOS PARAFUSOS, REI DO TUCUNARÉ e até um inusitado REI DO TAMBAQUI ASSADO. 

É certo que o espectro da violência já ronda a cidade, mudando hábitos antigos. Mas persiste o costume (tão nosso!) de pedir "emprestado" uma colher de pó de café, uma xícara de açúcar, dois dentes de alho, com o compromisso tácito de nunca pagar. Ainda há fuxico, brigas de vizinhos, gestos de solidariedade, grandes cumplicidades e toda essa teia tênue que dá consistência ao tecido comunitário. Ainda há um geito teresinense de ser.

Mas há outra cidade que desponta veloz, que se verticaliza como se quisesse distanciar-se de tudo que lembre a província. É a cidade dos edifícios com nomes de celebridades; dos que tem os pés aqui e a cabeça em Miami; dos que não vivem sem a presença do celular; dos que só circulam à noite; dos que fazem grandes negócios; dos que ignoram a lei; dos que nada temem; dos que metem medo, dos que, tendo nascido aqui, não sabem exatamente onde fica Teresina.

Impedir que essa cidade veloz e voraz engula a cidadezinha que se fez com trabalho, sacrifícios e ternura é tarefa inadiável. é preciso mostrar aos bem-nascidos, aos alpinistas, aos emergentes que há espaço para todos: para o Teresina Shopping e para o Mercado do Mafuá; para o Tarrafa's e para o Restaurante da Tijubina; para o Garden e para o Cabaré da Pretinha; para o Ensaio Vocal e para a Maria da Inglaterra, com o seu famoso "Estrela de Luzilândia", o único conjunto do mundo capaz de acompanhá-la, ou melhor, de persegui-la.

Que a cidade cresça, prospere, se modernize, mas sem abrir mão do que tem de melhor: a generosidade com que acolhe a todos, como acolheu, numa remota manhã de maio de 65, este cronista de meia-tijela que está fazendo todos esses volteios apenas para dizer o óbvio: TE AMO, TERESINA.

Jornal MN, 2000

em As Despesas do Envelhecer 
Teresina: Corisco, 2001

10.4.16

MISSÃO, Hardi Filho




Sob a grande nuvem
o clamor final.
Inúteis as máquinas
e os monumentos
ermos campos águas poluídas
cidades: jardins de cinza.
Na noite vazia
descerá das estrelas
um brilho incontemplado
e o dia nascerá para ninguém!
...........................................
Se os homens-antibióticos arquitetam
a noite incomum,
se os anti-homens constroem
                                    o dia nenhum,
o homem-Homem tem como missão
proteger o amor
construir casamata abrigo seguro
salvá-lo do caos, concorrendo
no caso
para que a vida recomece!



Hardi Filho
em BAIÃO DE TODOS
Antologia Poética organizada por Cineas Santos
Teresina, Editora Corisco (1996)

O MURO, Hardi Filho




A vida pinta no muro o vermelho
perigo a todo instante dia a dia
e pinta o verde, em céu azul, nuns ricos
bordados de pureza e fantasia.

Drama aventura evento a vida pinta
no muro o preto o amarelo o lilás;
refração de água e sol ela reflete
estas coisas indecisa entre ânsia e paz:

arco, armação, parábola, temores.

A morte pinta no muro outras cores.



Hardi Filho
em BAIÃO DE TODOS
Antologia Poética organizada por Cineas Santos
Teresina, Editora Corisco (1996)

"Nos fios elétricos", Halan Kardec Ferreira Silva




Nos fios elétricos
andorinhas descansam asas,
úmidas da viagem



Halan Kardec Ferreira Silva
em BAIÃO DE TODOS
Antologia Poética organizada por Cineas Santos
Teresina, Editora Corisco (1996)

"É grave o pássaro", Halan Kardec Ferreira Silva




É grave o pássaro
que me repropôs a paz dessa manhã:

só estar ali pousado,
grávido de um canto
mais triste que o meu silêncio.



Halan Kardec Ferreira Silva
em BAIÃO DE TODOS
Antologia Poética organizada por Cineas Santos
Teresina, Editora Corisco (1996)

"me resta olhar", Halan Kardec Ferreira Silva




me resta olhar
o tempo crispar as frutas
na bandeja sobre a mesa,
ou nas sacadas desses apartamentos
mirar as solidões destroçadas.



Halan Kardec Ferreira Silva
em BAIÃO DE TODOS
Antologia Poética organizada por Cineas Santos
Teresina, Editora Corisco (1996)

2.4.16

TERESINA, Domício Proença Filho


                        para Cineas Santos, amigo-irmão


Mar de copas verdes
inebriadas
à carícia dos ventos
dóceis e violentos.
Emergentes,
cúmplices da beleza
suavemente rubra,
os tetos-ilhas
do amigo casario.
E a placidez do rio.

Arranha-céus ao fundo,
concretudes de progresso,
o asfalto
frenético da vias.

Pleno de luz, o dia
E de coragens.

E em tudo
um sabor
de alumbramento.

A cidade sorri
num abraço caloroso:
o aconchego-irmão
da gente-teresina.


                        Rio de Janeiro, 07-07-2008


Domício Proença Filho
em TERESINA: Um Olhar Poético
Teresina: FCMC, 2010
Organização de Salgado Maranhão

31.3.16

PORTAL DA CIDADE, Cineas Santos




Portal da cidade, a Praça Saraiva era o desaguadouro natural dos que chegavam a Teresina na década de 1960. Paus-de-arara, mistos, jardineiras despejavam passageiros empoeirados e sonolentos no meio da praça, enquanto os chapeados disputavam, no grito, a bagagem dos que tinham algo a transportar. Mocinhas ágeis e prestativas se prontificavam a levar o “chegante” à “pensão mais em conta”, nunca esquecendo de garantir ser o estabelecimento  “um ambiente totalmente familiar”. Quem vinha a negócio fretava carros de aluguel (jipe, rural-willys), mais pose que necessidade, já que as distâncias a percorrer eram pequenas. Os que necessitavam de cuidados médicos, quase sempre muito pobres, armavam redes sujas nos galhos das árvores em busca do refrigério da sombra. Os que vinham tentar a sorte – náufragos e deserdados – limitavam-se a zanzar a esmo como moscas tontas.

A praça era uma imensa feira livre onde se vendia quase tudo: de animais vivos a óleo de puraquê, “a farmácia que o freguês carrega no bolso”, garantiam os camelôs. Sem maior esforço, podiam-se encontrar ali especialistas nas mais diversas atividades: borracheiro, barbeiro, soldador, amolador de tesoura, cozinheiro, raizeiro, vidente e benzedor, sem contar a legião de marreteiros e descuidistas, prontos a engrupir os desavisados. Pedintes de todas as idades esparramavam-se no chão, recitando desgraças “de cortar coração”.

Numa manhã esplendente (2 maio de 1965), despejaram-me na Praça Saraiva. A poeira da estrada embaçava-me a visão e o medo latejava em cada milímetro do corpo. Por intuição, percebi o que me esperava: fome, indiferença, solidão. Uma cigana decrépita, cheirando a sarro de cachimbo, prontificou-se a ler-me a mão, mas uma das “agenciadoras de hóspedes” foi mais rápida e me arrastou para a Pensão Nova, na Paissandu. O cartão de visitas da pensãozinha era um inconfundível cheiro de urina que se fazia anunciar na calçada. Na portaria, um negro velho, com ar de mãe preta, fazia as honras da casa. Foi direto e conciso: “O pernoite, com direito a café da manhã, custa dois cruzeiros. Pagamento adiantado”. De posse do dinheiro, desmanchou-se em mesuras: “Se precisar de alguma coisa, é só chamar. Eu sou que nem téu-téu: não durmo nunca!” e piscou, malicioso…

À noite, enfurnado num quartinho escuro e quente, sob o fogo cerrado das muriçocas, eu nem suspeitava que aquela ruazinha de aspecto sórdido fosse o caminho mais curto entre o Clube dos Diários e o prazer. Estrela, Fascinação, Amambay… Proxenetas, cafetinas, prostitutas, tangos, rumbas, boleros, perfume barato, bebida “batizada”, estrias camufladas, boêmios, bêbados, pedintes. A dois quarteirões da pensãozinha ordinária, diluíam-se todas as fronteiras. A Paissandu era o único espaço democrático da cidade: bem-nascidos e bundas-sujas dividiam, equitativamente, generosas rações de sífilis…

Aos poucos, a cidade mostrava suas múltiplas faces. Em meio às agruras, alguns encantos: o Parnaíba, o verde, as mulheres. Eu vinha de uma terra sem rios e sem lembranças de rios. Ver tanta água fluindo rumo ao desconhecido me pareceu um desperdício. O verde dos quintais me enchia os olhos: “um oásis sem deserto”. Quanto às mulheres… por elas, fiquei e não me arrependo. Com o tempo, a cidade foi-se adonando de mim, até me fazer esquecer que um dia morei em outro lugar. Teresina me basta.



Cineas Santos
Crônica de abertura de TERESINA PARA AMADORES
Livro ainda no prelo

28.1.16

IMPRESSÕES DE VIAGEM, Edmar Oliveira


Uma amiga perguntou pelo Piauinauta, que não sai há quase um mês, e eu falei que estava enrolado com o lançamento do meu TERRA DO FOGO em Teresina e que tinha de ficar lá por uns dez dias. Ela então falou: “sei, você está de licença paternidade”. Acertou assim.

Cheguei para o “Sarau dos Amigos do Cineas” na Oficina da Palavra, onde o livro foi muito bem recebido. Passei toda a semana indo ao stand do Leonardo, que tem editado livros de escritores da terra (muito bem caprichados), autografando o TERRA DO FOGO, que por sinal esgotou o estoque de lançamento. Eu e Salgado Maranhão fizemos um bate-papo literário discutindo o meu livro e o dele (MAPA DA TRIBO) para uma plateia de cinquenta a sessenta pessoas às oito horas da manhã, o que me surpreendeu. Geraldo Borges estava lançando ESTAÇÃO TERESINA anunciado aqui no Piauinauta anterior.

Boas conversas com Paulo Tabatinga, Gisleno Feitosa, Rodrigo M Leite, Durvalino Couto, Feliciano Bezerra, Wellington Soares, Cineas Santos, Graça Vilhena, Paulo Vilhena, João Carvalho, Fonseca Neto, Alexandre Carvalho, Gilson Caland, Climério Ferreira e  Helô, Keula Araújo, Luana Miranda, Poeta Willian, a muito jovem e bonita escritora Fran Lima, Deusdeth Nunes e a turma do Conciliábulo, entre tantos outros que tive por bem encontrar. Fui entrevistado por várias emissoras de rádios que cobriam o evento, entre elas a de Marcos de Oliveira e a de Leide Sousa. E ainda deu tempo gravar um depoimento sobre o cinema marginal dos anos 70 para Patrícia Kelly e Morgana, que fazem um documentário como monografia do curso de história e jornalismo. As meninas são brilhantes. E eu estou tão velho que virei pesquisa. Mas é bom ser reconhecido.

Tinha tudo pra ficar contente. Mas não fiquei.

Me hospedei no Hotel Central, em frente ao Clube dos Diários, ao lado da Praça Pedro II e seu Teatro 4 de Setembro, complexo que foi outrora o centro pulsante e cultural da cidade. Após cinco dias fui para a casa do meu irmão Maioba angustiado pela solidão. A cidade entre os dois rios, que se estendia do encontro de suas águas no Poty Velho até a Vermelha (citada no filme genial do Torquato Neto) não existe mais. Foi definitivamente abandonada por seus habitantes que atravessaram o Rio Poty e ergueram uma cidade moderna na zona Leste. Mas que não tem nenhuma lembrança da minha cidade.

A minha cidade é uma cidade fantasma. Os poucos e pobres habitantes que ali ficaram não saem de noite nas suas ruas escuras com medo de assalto. Trancam-se em suas casas. Os de mais posses fazem cercas elétricas para protegerem a sua solidão. As ruas foram entregues ao drogados, aos desocupados que ocupam uma cidade sem lei e sem ordem. Em suas ruas desertas, mesmo ao meio dia, encontrei duas pessoas usando drogas. Não senti qualquer medo. Eram pessoas que eu conhecia da minha infância naquelas, outrora, ruas agitadas. Agora estavam os dois usando drogas numa cidade trancada com medo deles. Esquisito. Conversamos sem medo entre nós. Eu não me senti ameaçado por eles. Fiquei com pena de a cidade os terem tragado pela fumaça de um inexistente futuro.

Sem querer contrariar os meus anfitriões do Salão do Livro do Piauí (SALIPI), até entendo os seus motivos de o terem tirado da Praça Pedro II para que acontecesse este ano na Universidade Federal, que também fica na Zona Leste da nova cidade. Mas não concordo.

Desculpem, mas penso que a cultura abandonou também a cidade antiga. Não digo que ficou elitista porque a Universidade pública congrega estudantes de todas as classes. Mais ainda com o sistema de cotas. Mas acho que a cultura abandonou também a cidade antiga. É preciso que analisemos este fato mais devagar. Não vou fazer agora.

No livro que em Teresina fui lançar conto uma história triste que a cidade tinha esquecido. Os incêndios dos anos 1940. Acho que em breve um cronista vai contar essa história, também muito triste, do abandono da cidade antiga. A impressão que eu tive, e que me encheu de tristeza, é que ela não mais existe. E uma cidade sem passado é uma cidade sem futuro. 


em 15 de junho de 2014
em Piauinauta

25.1.16

O RIO, Paulo Machado


ao poeta Cineas Santos


preciso urgentemente escrever um poema!

que os versos sejam vorazes,
lembrando o rio de minha cidade,
comendo as pedras do cais.

mas como escrevê-lo?

como domar o rio de minha cidade
à condição de poema?

o rio de minha cidade não pede adjetivos,
principalmente recusa os que o tornam abstrato.

o rio de minha cidade é um rio migrante,
por que aprisioná-lo no corpo do poema?

o rio de minha cidade guarda em suas entranhas
o orgulho do homem sozinho.

o rio de minha cidade é água viva na carne,
água pesada na memória.

o rio de minha cidade é torto
como uma cicatriz,
fazê-lo reto seria contradizê-lo.

vivê-lo, petrificá-lo nas retinas.
esquecê-lo, jamais.

preciso urgentemente escrever um poema!



em "ta pronto seu lobo?" 
Edições Corisco: Teresina, 2002 (2ª edição)

15.1.16

OBSTÁCULO EM DESATINO




Eita meu rio Poty amado
Soube cá do outro lado
Pelas ondas do Joel
Que andas desembestado
Feito jumento sem mãe

Não te cabes mais no leito
Perdeste a calma e o jeito
Põe-se tudo a devorar

Cabeça de Cuia anda apavorado
Com medo de se afogar
Na conversão dos vinténs
Parnaíba deságua de vez em ti
E não tarda

Eras isto o que querias
Na vez de uma veia louca
De artérias entupidas
Correr sem prumo em descida

Quero ver de novo tua floresta de pedras
Milenares, eu quero
Tua vadiagem na Curva São Paulo
Esquecestes de ser os dengos dos manguezais
Das encostas e das Ilhotas já perdidas

Água tua agora sim
Cabelo não há de ter
Deixastes que aterrassem as lagoas
A teu descanso
O Rogério Newton me contou

Ai meu rio Poty amado
Não mais prenuncias o cheiro dos cajus
De Fátima e dos Noivos
És um obstáculo para os shoppings da city
Agora um river out side
E a culpa é tua, só tua…



Acilino Madeira
em Portugal, 06 de maio de 2009

1.12.15

A POÉTICA DO HOMEM E OUTROS BICHOS ESQUECIDOS, por Menezes y Morais




Os olhos do poeta Hindemburgo Dobal Teixeira (1927-2008) brilhavam repletos de ternura naquela tarde, na qual ele, Cineas Santos e o autor dessas virtuais traçadas linhas, saboreávamos um cafezinho em sua casa, em Teresina (PI). De férias na cidade, morando em Brasília, sabendo que H. Dobal fora acometido pela doença de Parkinson, pedi ao CS que me levasse até sua casa.

Poeta consagrado, premiado, servidor público aposentado, cidadão do mundo que morou em Teresina, Rio de Janeiro, Brasília, Londres e Berlim, HD parecia feliz naquela tarde. Creio que isto aconteceu em 1994. Dobal indagou se eu queria café com açúcar ou adoçante. Diante a minha negativa, observou, com um sorriso sincero nos lábios:

"Você tem razão, doçura só a da vida".

CONVERSAMOS amenidades, dias depois eu voltei a Brasília, sem entretanto esquecer aquela frase ecoando na memória, que bem pode ser um verso: "doçura só a da vida".

O que mostra que Dobal não sofria da doença chamada alienação política, essa gente costuma creditar a vida as mazelas sociais e históricas que infernizam a odisseia humana, esquecendo que o verdadeiro inimigo não atende pelo nome "vida", mas pela alcunha "poder", a forma de como o "Estado" é organizado.

A vida é inocente. Como dizia Sarte, "o inferno são os outros".

SE DOBAL tivesse resistido um pouco mais, talvez sua viagem definitiva fosse prorrogada por mais tempo, pelo milagre das células-tronco, a grande esperança da revolução na medicina neste surpreendente século XXI.

H DOBAL debruçou-se sobre a existência humana, falando no "homem e outros bichos esquecidos", diz num poema. Nada escapou do seu olhar poético e crítico. Da solidão humana povoando a tarde, à solidão dos homens anônimos encharcando o dia.

Flashes da vida, retratos do cotidiano - Rio-Teresina-Brasília-Londres-Berlim - o atento olhar dobalino observou mudanças na geografia física da cidade - Roteiro Sentimental e Pitoresco de Teresina, Os Signos e as Siglas (Brasília) - e nas paisagens humanas, produzindo uma poética onde não faltam mergulhos objetivos e subjetivos na condição humana.

A OBRA de HD dá uma sacudida dialética na cabeça e no estômago do leitor. Poeta de paisagens, tempo, gentes, lugares, dos rebanhos do tempo, do homem ou da vida simplesmente, Dobal ainda encontrou uma folguinha para criticar a poesia rimada e metrificada.

Mesmo quando escreveu ficção (Um Homem Particular), condimentou poeticamente a sua prosa, as vezes é um poema quase inteiro, embora com o final frouxo, aguado, prosaico.

O olhar atento do poeta registra mudanças na rota do tempo, o que faz de HD um cronista do tempo. A "Província" de Dobal é o mundo, mais ou menos como a aldeia de Marshall McLuan é a aldeia global.

A GLOBALIZAÇÃO do capitalismo começou no período das grandes navegações, no mercantilismo, quando o colonizador europeu transformou as populações nativas (chamadas índios) e povos africanos em mercadoria, mão-de-obra escrava.

Tudo isso consta do ideário poético de H. Dobal: os índios piauienses que foram massacrados (Acoroazes, Pimenteiras, Gueguezes, Tapuyas), ganharam um poema épico (El Matador), onde nomina um dos chefe da chacina, o tenente-coronel João do Rêgo Castelo Branco (1776-1780).

FALTOU o pistoleiro de aluguel, o assassino por encomenda de índios e africanos, o bandeirante Domingos Jorge Velho, que é nome de rua no país inteiro e de colégios, inclusive em Teresina.

DJV chefiou a expedição militar da monarquia que assassinou Zumbi dos Palmares (?-1695). Por todas os crimes que cometeu, sempre bem remunerado, DJV é considerado um "herói" nacional. Até quando?


Dobal exaltou heróis da independência - anônimos (Memorial do Jenipapo, "o sonho anônimo dos que morreram pela liberdade") e resgatou o histórico poeta piauiense Leonardo de Carvalho Castelo Branco ou Leonardo da Senhora das Dores Castello-Branco, que foi preso no Piauí, Maranhão e Portugal.

Em tempo: a vida do poeta e inventor Leonardo também deveria ser estudada nas escolas do ensino médio do Piauí e do país.

Não temos sequer um retrato de Leonardo. Lembro de algumas conversas que eu tive, na década de 1980, com o publicitário, letrista (tem obras-primas com o cantor e compositor Edvaldo Nascimento) e poeta Durvalino Filho, nas quais me dizia, empolgado:

"Vamos forjar um retrato do Leonardo".

A GRANDEZA ética e estética da poesia de HD parte do micro para o macro, da solidão para a alegria (me divirto lendo Serra das Confusões), da vida para a destruição da morte: a Poesia vive.

Dobal deu-se ao luxo de achar alguns dias inuteis, por ser um repórter do tempo, cuja poesia fotográfica não poupa o mal caratismo popular ou elitista.

A poética dobalina é uma radiografia da existência social, iniciando pelo começo, da Província à contemplação da paisagem, registrando universais tipos humanos.

NEM A gente simples e humilde com seus flagrantes de virtude e desvirtude escapou de suas retinas. As qualidades estéticas de HD já foram exaltadas por poetas e estudiosos da literatura. Entre eles Manuel Bandeira, Odylon Costa, filho, Álvaro Pacheco, Fábio Lucas, Cristina Maria Miranda de S. P. Correia, M. Paulo Nunes (grande contemporâneo e companheiro de Dobal), Almeida Fischer, Cineas Santos (anjo da guarda de Dobal, na fase aguda da doença de Parkison) e a professora Maria G. Figueiredo dos Reis.

LEMBRO bem daquela tarde, Cineas com o olhar fixo no poeta, eu bebendo café puro e Dobal sorrindo com seu jeito piauiense universal de ser, com sua ternura e humildade diante o mistério, se emocionando com o dia bonito pra chover.

Por que Deus não nos deu o poder de congelarmos o tempo nas retinas da tarde?



via blogue de Kernard Kruel



22.11.15

Maria da Inglaterra - "Mulher Cabra-Macho"






Documentário média-metragem que resgata a história de vida da cantora e compositora piauiense Maria da Inglaterra, contada por suas próprias palavras e por entrevistados que fizeram parte de sua carreira. Maria da Inglaterra "Mulher Cabra-Macho" é o resultado do trabalho de conclusão de curso do jornalista piauiense Patrício Lima, pela Universidade Federal do Piauí (UFPI), em novembro de 2012. O documentário teve a orientação da jornalista e professora mestre Luciana Chagas. As imagens, edição e pós produção ficam por conta de Pedro Júnior Mendes. Já as imagens de apoio são dos fotógrafos Moisés Saba e Maurício Pokémon. Entrevistados: João Claudio Moreno, Patrícia Mellodi, Júlio Medeiros, José Dantas, Lázaro do Piauí e Cineas Santos.


[...]


Personalidade popular e querida em todo o estado do Piauí, muito considerada por seu talento e sabedoria no modo de viver. Em 1975, foi descoberta por Ricardo Cravo Albin, quando, em viagem pelo Brasil através do PAC - Plano de Ação Cultural do Ministério da Educação e Cultura - berço da futura FUNARTE, com o projeto História da Música Popular Basileira "De Chiquinha Gonzaga a Paulinho da Viola". Na ocasião, o pesquisador, impressionado com sua postura, que evocava ares de nobreza, a apelidou de Maria da Inglaterra, dando-lhe assim o nome artístico com o qual ficou conhecida por todos. Sua música penetra, inclusive, nas regiões interiores próximas ao seu estado natal. Começou a cantar para o público aos 26 anos, tendo Luiz Gonzaga como ídolo. (Dicionário Cravo Albin da Música Popular Brasileira)

1.8.15

H. DOBAL - UM HOMEM PARTICULAR






LAMENTAÇÃO DE PIETER VAN DER LEY
NO OUTEIRO DA CRUZ / H. Dobal


Eu, Pieter van der Ley,
soldado da Holanda,
trazido até aqui
na luta santa contra os papistas,
mas também movido
pelo sonho da aventura e da riqueza,
fui morto aqui numa emboscada
dos guerrilheiros do Brasil.
Fui morto aqui neste lugar
depois chamado Outeiro da Cruz
em memória desta emboscada.
E aqui me tenho para sempre.

Os meus derrotados camaradas regressaram.
Eu sou o filho pródigo que os pais nunca reviram.
A violência do sol, o peso das chuvas,
o tempo tropical não me desgasta.
Mas perdi para sempre o claro-escuro da Holanda,
os canais onde a água refletia as tabernas,
perdi as planícies onde o gado frísio
pastava na bruma,
onde o gado malhado
transformava em leite a pastagem gorda.
Aqui neste Outeiro da Cruz,
hoje envolvido,
hoje engolido pela cidade,
passam os que procuram o aeroporto e me deixam
as suas lições de bem partir, de mal partir.
Aqui por perto manobram os caminhões de refrigerantes.
Eu não parto. O meu refrigério é apenas
esta brisa triste trazendo os adeuses do mar.

Eu, outrora chamado Pieter van der Ley,
espírito preso neste Outeiro da Cruz,
cumpro uma pena interminável,
expio um pecado de que não me lembro.
O meu corpo de vinte anos,
depositado neste chão,
composição que se decompôs rapidamente,
o meu corpo me abandonou.
A minha pele clara, os meus olhos claros,
os meus músculos, os meus cabelos ruivos
me abandonaram.
E aqui me tenho: menos do que sombra.
Corpo etéreo, fantasma, alma penada,
que ninguém vê,
que ninguém ouve,
que ninguém conhece,
neste exílio post-mortem.



[...]



Gênero: Documentário
Direção: Douglas Machado
Elenco: H. Dobal, Alberto da Costa e Silva, Álvaro Pacheco, Cineas Santos, Olga Savary, Ivan Junqueira, Wilson Martins, João Cláudio Moreno

3.2.15

HINO DE TERESINA


Risonha entre dois rios que te abraçam,
Rebrilhas sob o sol do Equador;
És terra promissora, onde se lançam
Sementes de um porvir pleno de amor.

Do verde exuberante que te veste,
Ao sol que doura a pele à tua gente,
refulges, cristalina, em chão agreste;
Lírio orvalhado, resplandente.

"Verde que te quero verde!"
Verde que te quero glória,
Ver-te que te quero altiva,
Como um grito de vitória!

O nome de rainha, altivo e nobre,
Realça a faceirice nordestina
Na graça jovial que te recobre,
Teresa, eternizada TERESINA!

Cidade generosa- a tez morena,
Um povo honrado, alegre, acolhedor;
A vida no teu seio é mais amena,
Na doce calidez do teu amor

"Verde que te quero verde!"
Verde que te quero glória,
Ver-te que te quero altiva,
Como um grito de vitória!

Teresina, eterno raio de sol
Manhãs de claro azul no céu de anil;
És fruto do labor da gente simples,
Humilde, entre os humildes do Brasil!

"Verde que te quero verde!"
Verde que te quero glória,
Ver-te que te quero altiva,
Como um grito de vitória!


Cineas Santos
Letra do Hino de Teresina/PI 
Conforme Lei n° 2.408 de 14.07.95, 
Que “Institui o concurso para escolha do Hino Municipal de Teresina”


5.4.14

CORAÇÕES DA TERRA, por Menezes y Morais




...

compadre salgado maranhão
destrói do teu cérebro essa ideia suicidade

q os trabalhadores te querem em luta
i a poesia te quer vivo
nesses tempos de anistia ampla
y corações restritos

...

nossos amigosão pessoas bonitas
na dimensão da fala dialética grito
o cineas vem de uma gleba seca com a
água de sua ternura
o william se fez poeta engajado pra
alegria da poesia
o eduardo não acredita no amanhã pra
desespero de mais um dia
todos lindos
todos livres na prisão do dia
nesses tempos de anistia ampla
y corações mesquinhos

o arnaldo albuqueque
o fernando s. costa
o albert piauí desenham os sóis dessas noites frias

armadas de fuzis e bombas de hidrogênio

(aquelas q matam os homens e
conservam intactas as propriedades do rei)
e o luiz bello afirma que precisamos
criar o ministério da paz
e o povo bebe tanta pinga e fuma
tanto medo só pra ter coragem
nesses tempos de anistia restrita
e corações gerais

a marleide
cabelos dourados baloiçando

ventos do céu

dessadjetivada democra-
                                cia mina dos olhos
                                  imperialistas

a beth rego
o rubervam du nascimento a profissão dos peixes
no tempo
o sussurro o grito o homem da rua
timon a voz do trovão
a ana miranda a rosinha lobo as cores
dos sonhos
o pólen do sol
o zémagão

viajamos na constelação de vênus e foi tão bonito
e até hoje nos amamos e acreditamos
na decadência final
de tudo a-kilo
e eu sou um sol e vou parir um crepúsculo

nesses tempos de anistiampla
y corações aflitos

o chico casto de camisaberta
na filosofia do tiro
a leila a homeopatia
memórias da ilha do fundão
postais do paraíso
a ednólia fontinele o bernardo silva
o arimatan a elnora o teotônio do sax
o zeferino alves neto a rosa o sales
herculano moraes o pds
o chico miguel de moura o universo das águas
o emerson araújo
a janete dias baseada na era
o candeia o varanda o fruta madura
as asas do rubens costa
a vida operária
a canção permanente
raimundo alves lima
o clebe montezuma o kenard kruel a
pedra do sal
o fred maia da gota serena brilhando tranquilo

o antônio nobre (da dilertec) resiste na sua
dignidade branca
e o contista pedro celestino
conhece a história dos incêndios das
casas de palha
terror burguês em teresina
o wilton santos da cerca de arame do diadema e
do caco de vidro
a comadre nazaré leite desaflitadeolhosaberto
acampomaior
o otacilomendes
amaria da Inglaterra
o sal o suor
o repente o oriente
a verdura da terra
e na
        praça pedro II
os jornais a televisão e as revistas
informam q o mundo vai mal
o erlich cordão o jamerson lemos a poética
da necessidade
o paulo moura o wellington careca o
joão evangelista
o preço da liberdade
a eline menezes
o geilbert chaudanne
pássaros
terra do sol
     conquistada
o ubirajara dias (biroca) o genésio
araújo (tlinta e tlês)
o júlio pança o leo

o diário do piauí foi um jornal apaixonado
o beto pirilampo a rosilândia a sulika
a cultura orgânica
oroque moreira e seu gosto na berlinda
o fabio ator
o fim do mundo início de tudo é cedo ainda
e a dora parente luta pela felicidade
geral trabalhada
a coragem pra suportar os ataques
epilépticos do sono
o élmar carvalho poeta da vila e da liberdade

o j. barros o feitosa costa o heyden cunha
o raimundunho da medicina
sonhacom as transformações da espécie
e vive pela materialização do sonho
e a gildes silveira fala da cidade
grávida de sol e de fome
e o poeta hardi filho acredita
                                              o amor
é o pão que faz o homem
e o joão batista e a sandra almeida o tarciso
                                                                  prado
                                 
                               o sol no zênite
a dor de ser feliz q nos consome
o domingos bezerra
a rosa rubra sorrisonhos
fiapos de canções regados a cerveja
praça da liberdade
enquanto o império fatal marcha lento
pro necrotério do hospital
getúlio vargas
nesses tempos de anistia restrita
y corações de neocid
...
o gérmen da vida a força latente a
corrente do meu coração
o fábio torres a laranja partida ao meio
o laurence o eneas o providência o
pierri baiano o pão de centeio
parcelle eugênio o victor martins o
paulo pelicano
o assis linhares e o feitosa lit a mareília
o coqueiro o caetano
o santana e silva o teatro de rua
antes do golpe de 64
o geraldo borges e a história em
quadrinhos
lida no bar do gelati
quando a avenidatinhamais serafins
o zé afonso a opressão a guerra dos cupins
o ocimar barbosa o josemar nerys
          filhos do povir
o celso teodósio patrício
o zé o zé de luna a marieta a zuita o nael
          as meninas mocinhas-em-flor
a socorro magalhães a nonata o jacinto
a socorro araújo
o ar o gesto o laço o fato concreto
sonhos d'esperança
a certeza de que só existe q não foi criado
..........
pássaros-paisagens e botboletas
brincam no azul de altos
o bairro piçarra o ginásio álvaro fereira
              o cabaré da maroca
o maestro luiz santos a neguinha o
marquinho a mary o zaquee
o primeiro e o segundo amor a política estudantil

a sinuca a ternura da "tia" maria
solar estrelado
onde a gente se reunia messes tempos
de anistia
y corações do amanhecer
o chico alberto
o o.g. rêgo de carvalho a estrela azul
no céu da tarde

o wellington mendes a joana o iago
o exemplo luminoso: a solidariedade

o padre pedro maione
o padre sandro
o padre costinha
o pão o ecangelho a encarnação do verbo

o preço da vida
sabor dovinho
um camponês deseja a terra e a chuva
explode em flôr
o merlong nogueira o fonseca a travessia
o wellington o dce livre o me autônomo

a fufpi sitiada
o antônio josé da livraria punaré
a guerra do jenipapo a chapada do corisco
as sete cidades
teresa cristina
o deusdeth nunes a "mãe" ana o
mingau dos astronautas
os pastéis da maria divina
e a cervejinha bem gelada da maria tijubina

sol a pique
luadentro
viver teresina

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Menezes y Morais
Teresina 150 anos (fascículos do Jornal O DIA)
Teresina: 2002