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20.12.16

Cidade Frita, qual teu itinerário nesta tarde? um epílogo, por Chico Neto








Cidade Frita, qual teu itinerário nesta tarde? É certo que girarás no espaço, margeando o abismo, com teu Caronte Cabeça de Cuia, um dos guias neste inferno. Mas por quais caminhos do passado, do presente, do futuro teus pés escaldantes irão nesta tarde? Em quais poemas ressurgirá o choro que tua beleza uma vez provocaste? Aqueles corpos apaixonados que deitaram no leito de teus rios para nunca mais surgirão em que fotografia? Cidade Frita e os teus. O calor purifica feito água, faz esquecer e suar tudo quanto carregamos de memória, vida, morte. Mas, por um artifício, tu permaneces com tua penca de gente, de praças, de ruas, de momentos. 

Teu artifício: Cidade Frita.



Texto de Chico Neto, que acena no vídeo
Imagens de Rodrigo M Leite, nas
Torres da Igreja de São BeneditoAlto da Jurubeba, Teresina - Piaui


"cidade frita", Rodrigo M Leite


cidade frita entre rios
asfalto brita calafrios
idade grita entre pernas
sal limão sangue menstruação


Rodrigo M Leite
em A Cidade Frita
Teresina: 2013, versão atualizada

3.12.15

a cidade frita é um alucinógeno, Lucas Rolim


[procurando um bar na frei serafim]

o calor de 1000fps derrete a cidade em super slow motion
a liquidez dos pedestres e do dia evapora diante de pupilas detonadas

as retinas absorvem delírios litúrgicos no compor das multidões
a balburdia dos pés pavimenta a bad trip dos passantes

os pombos engolem a luz e espalham-na pelos picos das cabeças:
regurgitam quarenta e 1 graus de insolações nas epidermes secas

nos olhos, o ruminar da lisergia induzida pela sensação térmica
cria imagens psicodélicas que se perfazem na dança solar

a expansão dos ossos colapsa a estrutura das marquises
calçadas desenham o efeito do calor ao longo do corpo
e homens-camaleão deslizam pela sombra no horário de almoço

o dia ácido amplifica as alucinações dos estudantes
no torpor dos malabares, dos carros e dos mendigos
*A Cidade Frita: livreto do poeta Rodrigo M Leite
Poema enviado pelo autor

5.11.13

Rodrigo M Leite - síntese biográfica



Rodrigo M Leite nasceu na zona sub de Teresina - Piauí em mil novecentos e oitenta e nove. É formado em Letras - Português. Edita o blogue antológico Musa Esquecida
Desde dois mil e doze edita livros independentes e fanzines com seus poemas, entre eles: 
Tem poemas publicados em jornais, revistas e portais. 
Contato: rodrigoemeleite@gmail.com 

PREVISÃO DO TEMPO, Rodrigo M Leite


o morto esboçado no chão com sua moto
não é lembrado no mercado central
onde cresceu e não aparece há anos
o recém nascido evangelina rosa
grita primavera rouca
coro que anoitece os olhos do pai
pétalas de aço enferrujado
rasgam o asfalto frei-serafim meio-dia
quentura dos infernos
ônibus tiram fino das garotas cpi, todas iguais
a cidade respira pulmões encardidos
e o som vibrante de linhas com cerol nos postes mafuá
trilha o cotidiano de almas estendidas em varais


Rodrigo M Leite
em A Cidade Frita
Teresina: 2013 (versão atualizada)

20.5.21

02 Poemas/Momentos no Café Art Bar







CAFÉ ART BAR


da tarde que segue nervosa
homens surgem suados
carregados de preocupações
destinos a esmo
me vê uma antártica gelada
lá fora praça pedro segundo
a claridade destrói o asco
ferrugem que incendeia o portão velho
na entrada de um estacionamento
a urbe urge roncos trôpegos
a tarde é consumida dentro de um café




Rodrigo M Leite, publicado na Cidade Frita, Teresina: 2013, Versão atualizada



(...)



ENTRE BANCOS SORRI CAFÉ ART BAR


entre bancos sorri café art bar
as vontades da vista da praça
cheia de saudade do que não vimos.
entre postes
entre hippies
sorri meu mais novo amor
rodeado dos antigos
de restos e velhas construções
armações que o tempo preserva feito bibelôs
feito coração velho já amargo e frágil
com portas grandes e coisas sem valor.
entre bancos, pedras, rochedos velhos
sorrir meu novo amor.




Renata Flávia, enviado pela autora

9.4.20

Hotel São Francisco, em frente à Rodoviária, Rodrigo M Leite


combinamos
aquele hollywood o último
você pediu para fumar primeiro
que eu o acendesse 
na sua boca
bein não quero morrer igual aquele cowboy
da marlboro? relaxa
sobejo manchado de vermelho
tragadas esparsas cômodo sem luz
ainda não morremos tuf tuf tuf
não deixamos de fumar
mas aquele último cigarro 
que amamos juntos


Rodrigo M Leite, na A Cidade Fritaem janeiro de 2013

11.10.15

SAÍ PARA COMPRAR PÃES, Rodrigo M Leite


rua do mercado fora de época do parque piauí
domingo, após o almoço
tomates apodrecem
a rua é um rio
que destrincha um bairro
em vários bairros
rua da casa da avó paterna
de relance, na esquina
um cavalo elegante branco
brilha sozinho
rua da locadora de videogames do sena
ou rua da igreja
um gato atropelado
incrustado no calçamento

________________________[urubus ao alho
________________________e óleo

Rodrigo M Leite
em A Cidade Frita Ilustrada
Teresina: 2016

10.4.16

CHIQUINHO, GARRA!, Rodrigo M Leite

ao próprio

de uma revolução dos pirulitos enfim acontecida
chiquinho desceu às margens do rio
catou umas garrafas
colocou-as num saco, numa caixa de fogão vazia
deu uma passadinha no boca da noite
perdeu-se na noite fria

(a impressa dia seguinte não noticiou o acontecido)


Rodrigo M Leite
em A Cidade Frita
Teresina: 2012, versão atualizada

5.11.13

CENTRO NORTE, Rodrigo M Leite


no puta boteco para os rumos do verdão
o tempo está parado em um relógio sem pilhas
a vida ferrugem do balcão no fim
aos poucos sendo vencida

os velhos não se olham mais nos olhos
nas paredes mulheres desbotadas com garrafas de catuaba guaracy
fazem moças sexo ágil de fora
perderem o sentido

a alma do bar está acesa
em uma lata de sardinha com querosene
o coração dos homens lá dentro
vai sem muita pressa


Rodrigo M Leite
em A Cidade Frita
Teresina: 2013, versão atualizada

6.11.13

CAFÉ ART BAR, Rodrigo M Leite


da tarde que segue nervosa
homens surgem suados
carregados de preocupações
destinos a esmo
me vê uma antártica gelada
lá fora praça pedro segundo
a claridade destrói o asco
ferrugem que incendeia o portão velho
na entrada de um estacionamento
a urbe urge roncos trôpegos
a tarde é consumida dentro de um café


Rodrigo M Leite
em A Cidade Frita
Teresina: 2013 (versão atualizada)

5.11.13

A TABULETA É UM BAIRRO PESADO, Rodrigo M Leite


durante o dia
feéricas ondas de calor
misturadas com areia e saudade
envelhecem acontecimentos presentes
torrão chapado no corisco!
acabaram com teu engarrafante torto balão
teu centro reformaram reto, encruzilhante
porto das miragens litorâneas
que brotam do asfalto meio-dia
avenida barão de gurguéia com br três quatro três
à noite
junto dos gestos precários
homens sem sombras
partes da clandestina escuridão
são destruídos pelos peso das grandes scanias
que rompem para timon
carregadas de sal
adiante zona sub esquina da mapil
garotas esqueléticas formas
comedoras de brasa cuspidoras de fogo!
atiçam corações feridos de aço e sucata
esmagados pelo esquecimento


Rodrigo M Leite
em A Cidade Frita
Teresina: 2013 (versão atualizada)

11.6.21

Os Bares de Teresina, por Eugênio Rosa de Oliveira Ribeiro (2013)






Certa noite, pertinho do aniversário de 161 anos de Teresina, numa das cervejadas no Bar do Osvaldo, ficou uma pergunta no ar: O que ou quem mais representaria o jeito de ser da cidade de Teresina?

Conversando com o Conselheiro Fernando Porto, primeiro e único Comendador do Barrocão, veio a solução! Nossos bares e botecos são quem mais refletem a alma do Teresinense.

E por qual razão? Qual é a característica dos nossos botecos? O que os diferencia? Quais são eles?

A maioria de nossos bares é bem simples. Despojados, não muitos limpos (tem um com o nome “Bar do Imundo”), copo americano, cadeira de espaguete, ás vezes nem cadeira têm! E, apesar de serem um templo de celebração da mulher, são um ambiente eminentemente masculino.

O dono, geralmente mais grosso que lixa 40, contraria todas as lições do SEBRAE sobre a cortesia e atenção aos clientes.

No entanto, estes botecos são ponto de intelectuais, médicos, engenheiros, jornalistas, empresários, um sem número de pessoas conhecidas e bem sucedidas, além dos tradicionais cachaceiros dos diversos matizes.

Tem boteco frequentado pelas mesmas pessoas faz 40, 50 anos. Agora já são os filhos que estão tomando o lugar dos pais.

O Bar do Osvaldo, por exemplo, que funcionava perto da casa do estudante, antes de mudar para o Barrocão (ficou no lugar do bar do seu Luís Veloso, pai da primeira dama Lilian), foi frequentado por sucessivas gerações de estudantes (iam comprar ovo e sardinha!).

Muitos desses estudantes se formaram e, apesar de profissionais de sucesso, mantiveram o hábito de visitar o veterano da guerra (seu Osvaldo lutou no Suez).

No Osvaldo não há cadeiras, nem mesas. Quando aparece uma pessoa conhecida (só se for conhecida) ele tira detrás do balcão um tamborete e, assim, os fregueses se posicionam uns de frente para os outros nos dois lados do balcão.

O balcão de madeira do seu Osvaldo tem mais de cem anos e pertenceu ao comércio do senhor Adelino, depois fiscal de rendas do estado, pai do Agenor (engenheiro), Juscelino e Dilson Pinheiro (médicos já falecidos) que permaneceram, como o pai, assíduos frequentadores.

Local de encontro de muitos amigos como: Tancredo Serra e Silva, Edmar Mota e Bona, Peninha, Manoel Afonso, José Jucá Marinho, Bernardo Castelo Branco, Oscar Castelo Branco, Ivadilson, Raimundo Marvignier, Os irmãos Raldir, Bizarria e Roosevelt Bastos, José de Sousa Santos, Afonso Ferro Gomes Filho, João Agrícola dos Passos, Walter Moura, Alberoni Lemos Neto, Ismar Andrade, e muitos outros.

Dá tristeza saber que uma grande parte já se foi!

Outros bares formam uma verdadeira confraria. Um grande exemplo é o Santana. Reduto de famílias tradicionais, os clientes se sentem irmanados e muito amigos. É muito frequentado por empresários e profissionais liberais. Os membros promovem diversos eventos durante o ano: Carro dos Amigos do Santana no Corso, filme do ano, enduros e por aí vai... Tem cliente que começou criança tomando refrigerante no antigo endereço em frente à Igreja São Benedito.

Mas afinal, quais são os bares tradicionais de Teresina do passado e do presente? Eis alguns exemplos:

Maria Tijubina: ficava no Mafuá entre o muro do Cemitério São José e a linha do trem era frequentada por boêmios e notívagos muito conhecidos como José Lopes dos Santos e o mestre do cavaquinho da Rádio Difusora Caco Velho.

• Bar do 71: na Praça do Fripisa, o dono “o Neguin Baixo” só usava branco, roupa e chapéu. Era o ponto dos estudantes da Faculdade de Direito, que funcionava na praça, quando terminavam as aulas.

• Bar do Zé Garapa: na Piçarra onde funciona hoje a Jacaúna, ponto de encontro dos melhores jogadores de sinuca. O melhor jogador era o Raimundinho da Bindá. Seu irmão Antônio da Bindá era conhecido como o maior boêmio do Piauí e um grande cantor.

• Restaurante da Dona Maria Maior: localizado na Rua Paissandu, reduto boêmio. Quando terminavam os filmes, as tertúlias e o movimento da Praça Pedro II, os homens desciam. O nome oficial era Fála-se Hotel, possivelmente uma corruptela de Pálace Hotel.

Bar Carvalho: Muito famoso, frequentado pela elite, era da família do prefeito Firmino Filho e do vereador Inácio Carvalho, ficava na Praça Rio Branco e era considerado a melhor comida de Teresina.

• Bar do Cabecinha: No Cajueiro, antes funcionou na Santa Luzia com David Caldas, reduto do famoso Basilão dos Cajueiros.

Bar Carnaúba: dos irmãos argentinos Carlos e Osvaldo Fassi, ao lado do Theatro 4 de Setembro, totalmente feito de carnaúba. Em suas proximidades funcionava a Rádio Calçada, em frente a Lanchonete Americana, onde as decisões políticas do Piauí eram tomadas. Entre os seus frequentadores temos: Deputado Ciro Nogueira (pai), Dr. João Mendes Nepomuceno Neto, Prof. Magalhães (pai de secretario de segurança) dentre outros.

• Bar do porão do Clube dos Diários: onde existia um cassino

• Largo do Boticário, no Clube dos Diários: no corredor a esquerda de quem entra no Clube, reduto de escritores e intelectuais, até os garçons eram famosos: Raimundão (pai da delegada Vilma), Careca e Cirilo.

• Bar e Hotel Avenida: onde hoje é o Hotel Piauí (Luxor), frequentado pelos sírios e libaneses, nossos conhecidos carcamanos.

• Cantinho do Tufy: também de árabe, o dono era o Jesus Thomaz Tufy, exercia suas atividades na Rua Álvaro Mendes esquina com a Rua Simplício Mendes, foi a primeira lanchonete a vender esfirra e quibe na cidade.

• Bar e Restaurante do Auto Esporte Clube: Na Rua da Palmeirinha (Clodoaldo Freitas), lugar de quem queria comer uma boa panelada. Primeiro restaurante “delivery” de Teresina.

• Chicona do Poti Velho: figura folclórica fazia piaba frita e peixe de primeira (era quem fritava os peixes – bem poucos por sinal– de minhas pescarias no encontro das águas).

• Galinha da Júlia: única comida que se pode dizer que é genuinamente teresinense, funcionava perto do Hospital São Marcos. A galinha era feita em panela de ferro e lenha, recheada com mexidos e bastante condimentada. A receita morreu com ela, mas fez tanto sucesso que a tripulação da empresa aérea Real Aerovias, ao fazer escala em Teresina já vinha com a incumbência de levar a galinha para o Rio de Janeiro e outras cidades.

• Bar do Zé de Melo: em pleno funcionamento na Dom Severino, tão frequentado e querido que existe uma confraria organizada dos amigos do seu Zé.

VTS: Na Rua João Cabral, vende um peixe muito famoso e possuía uma seleta freguesia, exemplo: Totó Barbosa, Elisiário, Carlos Said e Nodgi Nogueira

E quantos outros! Miúda, Bar do Edverton, Gela Guela (a cerveja mais gelada da cidade), Rifona, Zé guela, Sapucainha, Coqueiro Verde, Bar do Gelatti, Pesqueirinho, Bar do Lula, Bar do João Veloso, Bar do Amauri (reduto de jornalistas), Bar da Tia Maria (no encontro das águas), do Ulisses, Zé Filho, Pé Inchado, Ribamar, do Pernambuco, Bar e Restaurante Acadêmico (do Pedro Quirino).

Em Teresina, o bar é tão importante que até candidatura de governador já foi decidida em um.

Até hoje, não há maior diversão para um teresinense da gema que encontrar os amigos no final da tarde e fins de semana, no seu boteco favorito, para trocar informações e esmaecer as tensões de um dia de trabalho.

Nem melhor local para se fazer amizades que duram toda a vida.

São os bares e botecos que fizeram a alegria dos teresinenses de ontem e de hoje.

E que refletem muito do nosso jeito simples e amigo de ser.



Eugênio Rosa de Oliveira Ribeiro
Em 10/08/2013 | Teresina/PI

Publicado no blogue do Poeta Elmar Carvalho "Recebi o vertente texto por WhatsApp. Não tendo o contato do autor, não lhe pude pedir autorização para a publicação em meu blog. Espero que ele não se aborreça. Quem me enviou o texto também não tinha o endereço virtual dele. Publiquei porque achei um texto muito bom e importante para a memória de Teresina."


9.4.20

10 poemas de "O Amor é Um Cão dos Diabos" de Charles Bukowski + Seu Rufino (Mercadinho Mescladinho)


cão

um cão apenas
caminhando sozinho numa calçada quente em pleno
verão
parece ter mais poder
do que dez mil deuses.

por que isso?



a música suave


vence o amor porque nela não há
feridas: pela manhã
a mulher liga o rádio, Brahms ou Ives
ou Stravinsky ou Mozart. ferve os
ovos contando em voz alta os segundos: 56,
57, 58... descansa os ovos, os traz
para mim na cama. depois do café da manhã é
a mesma cadeira e ouvir a música
clássica. A mulher está no seu primeiro copo de scotch
e no seu terceiro cigarro. digo-lhe
que preciso ir ao hipódromo. ela
está aqui há 2 noites e 2 dias. "quando
voltarei a vê-la?" pergunto. ela
sugere que fique a meu critério.
aceno com a cabeça e Mozart toca.



provaremos as ilhas e o mar


sei que em alguma noite
em algum quarto
logo
meus dedos abrirão
caminho
através
de cabelos limpos e
macios

canções como as que nenhuma rádio
toca

toda a tristeza, escarnecendo
em correnteza.



sozinho com todo mundo


a carne cobre os ossos
e colocam uma mente
ali dentro e
algumas vezes uma alma,
e as mulheres quebram
vasos contra as paredes
e os homens bebem
demais
e ninguém encontra o
par ideal
mas seguem na
procura
rastejando para dentro e para fora
dos leitos.
a carne cobre
os ossos e a
carne busca
muito mais do que mera
carne.

de fato, não há qualquer
chance:
estamos todos presos
a um destino
singular.

ninguém nunca encontra
o par ideal.

as lixeiras da cidade se completam
os ferros-velhos se completam
os hospícios se completam
as sepulturas se completam

nada mais
se completa.



os insanos sempre me amaram


e os subnormais.
ao longo de todo o ensino
fundamental
ensino médio
faculdade
os rejeitados se
uniam a
mim.
caras com um só braço
caras com tiques
caras com problemas de fala
caras com uma película branca
sobre um dos olhos,
covardes
misantropos
assassinos
tarados
e ladrões.
e em todas
as fábricas e na
vagabundagem
sempre atraí
os rejeitados. eles me encontravam
logo de cara e se grudavam
em mim. continuam
fazendo isso.
aqui na vizinhança há agora
um que me
encontrou.
ele anda por aí empurrando um
carrinho de supermercado
cheio de lixo:
bengalas partidas, cadarços
sacos vazios de batata frita,
caixas de leite, jornais, canetas...
“ei, parceiro, o que tá fazendo?”
eu paro e conversamos um
pouco.
então eu digo adeus
mas ele continua me
seguindo
para além dos
puteiros e dos
prostíbulos...
“me mantenha informado,
parceiro, me mantenha informado,
quero saber o que está
acontecendo.”
esse é o meu insano do momento.
nunca o vi falar
com mais
ninguém.
o carrinho chacoalha
um pouco atrás
de mim
então alguma coisa
cai.
ele se detém para
juntá-la.
enquanto ele se ocupa disso eu
entro pela porta de um
hotel verde que fica na
esquina
cruzo
o saguão
saio pela porta
dos fundos e
ali há um gato
cagando
absolutamente deliciado,
que me arreganha os
dentes



alguma coisa


estou sem fósforos.
as molas de meu sofá
estouraram.
roubaram minha maleta.
roubaram minha tela a óleo de
dois olhos rosados.
meu carro quebrou.
lesmas escalam as paredes de meu banheiro.
meu coração está partido.
mas as ações tiveram um dia de alta
no mercado.



melancolia


a história da melancolia
inclui a todos nós.

eu, eu escrevo em folhas sujas
enquanto encaro fixamente as paredes azuis
e o nada.

estou tão acostumado à melancolia
que
a cumprimento como a uma velha
amiga.

farei agora 15 minutos de sofrimento
pela ruiva perdida,
digo aos deuses.

faço isso e me sinto um tanto mal
bastante triste,
então me levanto
REVIGORADO
mesmo sabendo que nada está
resolvido.

isto é o que eu ganho por chutar
a religião no rabo.
deveria ter chutado o rabo
da ruiva
onde estão seu cérebro e seu pão com
manteiga
na...

mas não, eu estava me sentindo triste
com tudo:
a ruiva perdida foi apenas outro
golpe numa longa vida
de perdas...

escuto uns tambores no rádio agora
e dou uma risada.

há alguma coisa errada comigo
além da
melancolia.



um poema rude


eles seguem escrevendo
despejando poemas...
jovens garotos e professores universitários
esposas que bebem vinho durante a tarde
enquanto seus maridos trabalham,
eles seguem escrevendo
os mesmos nomes nas mesmas revistas
todos escrevendo um pouco pior a cada ano,
lançando uma coletânea de poesias
despejando mais poemas
é como um concurso
é um concurso
mas o prêmio é invisível.
eles não escreverão contos ou artigos
ou romances
apenas seguirão
despejando poemas
cada um soando mais e mais como os outros
e menos e menos como eles mesmos,
e alguns dos garotos se cansam e desistem
mas os professores nunca desistem
e as mulheres que bebem vinho durante a tarde
nunca nunca nunca desistem
e novos garotos chegam com novas revistas
e há alguma correspondência entre homens e mulheres
algumas fodas
e tudo é exagerado e estúpido.
quando os poemas são recusados
eles os reescrevem
e mandam para a próxima revista na lista,
e eles fazem leituras
todas as leituras que conseguem
de graça na maioria das vezes
esperando que alguém finalmente os reconheça
finalmente os aplauda
finalmente os congratule e reconheça o
talento deles
estão todos tão certos de suas genialidades
há tão pouco autoquestionamento,
e a maioria deles vive em North Beach ou Nova York,
e seus rostos são como seus poemas:
iguais,
e conhecem uns aos outros e
se congregam e se odeiam e se admiram e se escolhem e se
descartam
e seguem despejando mais poemas
mais poemas
mais poemas
o concurso dos cretinos:
tap, tap, tap, tap, tap, tap, tap, tap, tap, tap...



meus camaradas


aquele ali ensina
aquele outro vive com a mãe.
e aquele outro é sustentado por um pai alcoólatra e rubicundo
dono de um cérebro de mutuca.
aquele ali toma boletas e vem sendo sustentado pela
mesma mulher há 14 anos.
aquele outro escreve um romance a cada dez dias
mas ao menos paga o próprio aluguel.
aquele ali vai de lugar em lugar
dormindo em sofás, bebendo e proferindo seus
discursos.
aquele ali imprime seus próprios livros numa máquina
copiadora.
aquele outro vive num vestiário abandonado
num hotel em Hollywood.
aquele parece saber como arranjar tostão depois de tostão,
sua vida é um preencher de formulários.
aquele ali simplesmente é rico e vive nos melhores
lugares enquanto bate às melhores portas.
aquele lá tomou café com William Carlos
Williams.
e aquele ali ensina.
e aquele lá ensina.
e aquele ali publica livros de autoajuda sobre como fazer
as coisas e usa uma voz dominadora e cruel.
eles estão em todo o lugar.
todos são escritores.
e quase todo escritor é um poeta.
poetas poetas poetas               poetas poetas poetas
poetas poetas poetas               poetas poetas poetas
a próxima vez que o telefone tocar
será um poeta.
a próxima pessoa a bater à porta
será um poeta.
aquele ali ensina
e aquele outro vive com a mãe
e aquele lá está escrevendo a história de
Ezra Pound.
oh, irmãos, somos as mais doentes e
as piores criaturas da raça.



cerveja


não sei quantas garrafas de cerveja
consumi esperando que as coisas
melhorassem.
não sei quanto vinho e uísque
e cerveja
principalmente cerveja
consumi depois
de rompimentos com mulheres –
esperando o telefone tocar
esperando o som dos passos,
e o telefone nunca toca
antes que seja tarde demais
e os passos nunca chegam
antes que seja tarde demais.
quando meu estômago já está saindo
pela boca
elas chegam frescas como flores de primavera:
“mas que diabos você está fazendo?
vai levar três dias antes que você possa me comer!”

a mulher é durável
vive sete anos e meio a mais
que o homem, bebe muito pouca cerveja
porque sabe como ela é ruim para a
aparência.

enquanto enlouquecemos
elas saem
dançam e riem
com caubóis cheios de tesão.

bem, há a cerveja
sacos e mais sacos de garrafas vazias de cerveja
e quando você pega uma
as garrafas caem através do fundo úmido
do saco de papel
rolando
tilintando
cuspindo cinza molhada
e cerveja choca,
ou então os sacos caem às 4 horas
da manhã
produzindo o único som em sua vida.

cerveja
rios e mares de cerveja
cerveja cerveja cerveja
o rádio toca canções de amor
enquanto o telefone permanece mudo
e as paredes seguem
paradas e estáticas
e a cerveja é tudo o que há.




Sr. Rufino, no Mercadinho Mescladinho,
Por Rodrigo M Leite

Poemas do livro:
O Amor é Um Cão dos Diabos, de 
Charles Bukowski