20.10.13

APARECEU UMA COCEIRA, por Deusdeth Nunes




Lá no Conjunto Saci
coça mulher e menino
coça lá e coça ali
e a coceira já chegou
lá no Parque Piauí

Tem uns que coçam a cabeça
tem outros que coçam o pé
A mulher coça o homem
o homem coça a mulher
a coceira foi andando
já chegou no Itararé

Meu compadre Chico Tripa
homem de educação
foi coçar dona Josefa
amigada com Borjão
que chegou e deu o flagra
no conjunto Redenção

A coceira anda muito
ninguém segue sua pista
ela gosta da Cohab
que é economia mista
já vi nego se coçando
no conjunto Bela Vista

A coceira está aí
a origem não se explica
ela dá em gente pobre
e também em gente rica
porque tem muito barão
se agarrando com curica.

Observação: Na década de 70 uma praga
de micose atacou a população do Saci



Deusdeth Nunes
em Rádio Calçada
Teresina: 1995


ABRAHÃO, O FILÓSOFO, por Deusdeth Nunes


Funcionando há mais de trinta anos naquela esquina da Rui Barbosa xis com o bar do finado João Arroz, o Abrahão é mais que uma lanchonete. É lá que centenas de estudantes e operários fazem a merenda mais barata e nutritiva da cidade com os famosos sucos feitos pelo próprio dono. Abóbora, manga, bacuri, cajá, abacate (fura rede  mamão, tudo feito com leite puro. Acompanha o suco uma banda de pão à gosto do cliente. Um verdadeiro empório, é um tem-tudo, muitas mercadorias muito antigas, a exemplo de cigarros que ele vende mais barato. Filósofo de balcão, os seus pensamentos vão do consumo de cigarro que ele vende mais condena em prosa, em verso e ao vivo. Quando o freguês vai comprar cigarro à retalho, ele dá um sermão: "Está provado que o cigarro faz mal à saúde e quem compra cigarro à retalho não tem condição financeira de sustentar o vício".

Sobre política, ele tira a forra sobre o IPTU que o castigou: "Vote nos candidatos a vereança de hoje que eles prometem tudo o que os passados prometeram. E certamente vão aprovar pelo voto, algo mais amargo que o IPTU aprovado pelos que estão aí".

Sempre atento ao movimento do balcão e principalmente da gaveta, escreve em cartolina e prega nas paredes internas: "Tem pressa em ser atendido? Adiante o dinheiro". "Sair sem comprar não dói. Comprar e não pagar dói muito. Pague antes".

Sua última conclusão filosófica diz: "É melhor ser roubado do que roubar. Por que? O roubado fica com uma graça a receber e o ladrão com uma dívida a pagar".


Deusdeth Nunes
em Rádio Calçada
Teresina: 1995

Deusdeth Nunes - síntese biográfica





Deusdeth Nunes, mais conhecido como Garrincha, nasceu em Aracaty - CE. Bancário, político, jornalista, escritor, humorista. Algumas publicações: Gente e humor; Peladas e peladeiros (2010); Teresina, seus amores (2007).

19.10.13

A LOUCA DA INFÂNCIA




O vestido rasgado, o corpo sujo, o rosto deformado por corte e pancadas, as mãos calosas cravadas nos cabelos desgrenhados na constante caça aos piolhos: Ratazana nas ruas da infância. Quando ela passava, catando restos de comida dos lixos, os meninos a cercávamos e, atirando pedras na louca, gritávamos:

- Ratazana!, tira!, tira!

Ratazana levantava a veste surrada, um sexo cabeludíssimo surgia, os meninos em cio vibrávamos, os paus latejando entre as pernas.

Zezinho perguntava: pé-de-pau? O coro respondia: tamarindo. Era a senha. Então André, o filho do bancário, ia a casa, trazia uma lata de doce. Chamariz infalível. Ratazana, morta de fome, não pestanejava, seguia André, ou melhor, o doce. Pouco depois, achávamo-nos sob o pé-de-tamarindo.

Começava a algazarra. Cada um queria ir primeiro. A maior briga. Todo mundo seco. Mas André botava moral, o doce é meu, dizia, arrogante, quem come ela primeiro sou eu. Ratazana, os olhos grudados na lata de doce, deitava-se, abria mecanicamente a pernas, André a cobria, depois outro, e outro, e outro...

No fim, Ratazana, exausta, arrasada, curvava-se sobre a lala de doce, comia avidamente. Depois, o estômago feliz, paspalhava-se a olhar pra gente com uns olhinhos tão meigos, com um sorriso tão cativante, que eu voltava pra casa com uma dor no peito, um ódio de mim, dos homens, do mundo.

Um dia chegou-nos a notícia: Ratazana morrera. Atropelamento. Nunca vi a molecada tão triste. Onde despejar o esperma acumulado? Tinha a masturbação, tinha o Morro do Querosene... mas não eram a mesma coisa.

Continuamos a frequentar o tamarineiro. Como um ritual em homenagem à mendiga, cavávamos buracos debaixo da árvore, metíamos o pau dentro, gozávamos, e fornicávamos, fornicávamos...

Hoje, passado tanto tempo, lembro-me de tudo com extrema nitidez. E me revolto ante essa minha primeira lição de miséria.



Airton Sampaio
em Painel de sombras 
Teresina: Edições Piçarra, 1980

JOANA




Josué esmaga a Frei Serafim. Num certo trecho observa um aglomerado de jovens bebendo - calças de fundo folgados, carrões, cocotas. Relembra o seu tempo de rapaz - roupas de segunda mão, subempregos, fome. Odeio esses filhinhos-de-papai, sangue-sugas. Quantos crimes praticados sob o efeito das drogas!

Josué procura limpar a vista, olha para o alto. O céu ainda azul de Teresina evoca-lhe Joana. Cabelos negros a escorrerem, longos, sobre os ombros sensuais, os olhos azuis a contrastarem com a tez morena do rosto delicado, portador de um nariz afilado, uma boca pequena, um queixo redondo.

Joana não resistiu. O corpo moreno, de pernas roliças, entrou num carango "enfezado". O riquinho deitou e rolou com a menina nas areias do Poty - eu me caso com você. Depois, satisfeita a tara, os olhos esbugalhados - então você pensou em casamento, gatinha? Logo comigo? A putinha sabe de quem sou filho? Ah, chorando? Será por causa do cabaço? Pra que pobre com cabaço, gatinha? Hahaaaaaa...

Aí "garotão" caminhou para Joana, o canivete de ouro em punho. Joana gritou, berrou, urrou, o medo no rosto lindo, o sangue escorrendo como o rio.

Numa banda de jornais Josué vê uma manchete garrafal: ASSASSINARAM JOVEM NA CALADA DA NOITE...

- Já indeterminaram o sujeito... Cumpriram o primeiro passo da estratégia da impunidade. O próximo passou: arranjar um bode expiatório. Quem sabe eu?

A noiva assassinada - ninguém acreditaria no testemunho do rio - sente vontade de esbofetar aqueles ricos todos, um a um, mas de que adiantaria, as coisas mudariam? Resolve parar de pensar -  a certeza de Joana enterrada - e sai caminhando na avenida, as mãos fora dos bolsos.

Um automóvel, alto-falante em cima, passa anunciando um rivengo.



em Painel de sombras 
Teresina: Edições Piçarra, 1980

AMOSTRAGEM




Uma cana, disse. O garçom, magríssimo, foi ao balcão e voltou num átimo, trazendo a bebida. Como tão as coisas, disse ele, tentando puxar conversa, o bar hoje até que não tá fraco. Em resposta monossilabei algo que se confundiu com um psiu vindo lá do fundo. Uma mulher de vermelho berrante, sozinha, chamava o garçom, psiu. Os meus olhos seguiram o olhar trejeitoso do homenzinho.

Conheço-o. Trata-se de um pobre coitado, funcionário público que, para manter em nível de sobrevivência os oito filhos, a mulher e a sogra, trabalha noite inteira no bar de seu Matos.

E a mulher de encarnado que Cipriano atende agora? Florisbela. As pernas carnudas - cruzadas em desleixo, o vestido muito puxado deixando propositadamente um naco de coxa de fora, os seios redondos arfando, o rosto pintadíssimo: Florisbela, prostituta famosa.

O copo de cachaça aterrissou na mesa dela. Um bêbado, na mesa em diagonal à minha, revolucionava o mundo, os olhos de tísico postos na lua, o bigodinho de pontas arrebitadas inflando-se para o companheiro mudo, sem feições.

À entrada rápida de um homem alto, esguio, mancando de perna direita, um senhor de cabelos grisalhos à minha esquerda sibilou, comunista!, e a esposa gorda - a papada quase a tocar os seios fartos - apoiou o escárnio, um sorriso balefe tremendo a cara. Um carvoeiro passou na rua, três jumentos carregados, o relho sobre o ombro. O mendigo Pocino também passou, bamboleando, babando, falando vida cachorra!

Três homens que bebiam no pé-do-balcão saíram abraçados, cantando desafinadamente uma música que contava uma história triste. Um negro entrou, camisa do Flamengo no corpo, sentou-se à mesa de Florisbela. Na mesa do centro duas jovens colaram as bocas num beijos de estremecer a sociedade.

Juntei as pontas do polegar e do médio, o estralo alcançou o ouvido apurado do garçom. Quanto devo? Tanto. Paguei, e saí.

Fora, envolvido pela madrugada em que aqueles seres se prolongavam - bêbados, mendigos, prostitutas, ladrões... - senti-me acometido por terrível angústia. Eu era um deles, era. Mas como escapar das ratoeiras, dos esgotos, dos lamaçais?

Toquei para casa. Lá a mulher me prepararia um ovo (ainda devia haver um), e eu, depois do sexo, me deitaria de papo pro ar e sonharia que nem o bêbado de bigodinho de pontas arrebitadas. De manhã o sol - que esquecia de retirar os seus raios da noite - acordaria Teresina, Teresina me acordaria, levanta homem!, e tudo voltaria ao que era.



Airton Sampaio
em Painel de sombras 
Teresina: Edições Piçarra, 1980

Airton Sampaio - síntese biográfica




Airton Sampaio de Araújo [ 1957 ] nasceu em Teresina - PI. Contista, professor universitário, crítico literário. Publicou Painel de sombra (Teresina, 1980, contos), Contos da Terra do Sol (Teresina, 1996, 2002), Sob um céu azul tigrino (Teresina, 2005, novela), Ocaso das tardes de domingo (Teresina, 2012, novela, e-book). Participou das coletâneas: Novos contos piauienses (Teresina, 1986), Crônicas de sempre (Teresina, 1987, contos), Concursos literários do Piauí: contos (Teresina, 2005) e Geração de 1970 no Piauí - contos antológicos (Teresina, 2005). Integra o Grupo Tarântula de Contistas.

18.10.13

DESPEDIDA


                                ao sertanejo Antônio Ribeiro


Teresina adeus, adeus!
Adeus rio Parnaíba!
Vô voltá pa minha terra,
Pu sertão das Carnaíba.

Já chegô premêra zagua,
Truvão fraco, chuva grossa,
É sina de com inverno,
Vô cuidar de minha roça.

Vô ispiá pus campo verde
Iscutá o gême dos tôro,
I cumê quaiada boa,
Isccurrida ou mermo in sôro.

Teresina adeus, adeus!
Pu sertão eu vô voltando...
Lá deixei uma caboca
Num ranchinho misperando...



fonte: Jornal O Dia, ano 11, nº 101 
Teresina: 4 janeiro de 1953

Hermes Vieira - síntese biográfica


Hermes Vieira, por Cazé - década de 80


Hermes Rodrigues Cardoso Vieira [ 1911 - 2000 ] nasceu na Fazenda Caiçara, Elesbão Veloso - PI. Poeta popular, cronista, romancista, indianista e folclorista. Tem publicado: Poemas Nordeste (1988); Piauí Sertão (1988), entre outros.

3 POSTAIS DE TERESINA




Postal I


Na Paissandu e adjacências bêbados passeiam
equilibrados sobre a corda bamba dos pés.
Velhas meretrizes sem freguesia
conversam e cospem na calçada.
Nas noites serenas de serenatas
as luzes mortiças dos postes
espiam de pálpebras cansadas
os amores camuflados clandestinos (in)decentes.
Os amores puros, sem rotas e rótulos.
A lua, velha safada, espreita a intimidade
das alcovas dos casais.



Postal II


No Morro do Querosene

- sem quero, sem querosene e sem gás -
a miséria mora em cada casa
sem água e se luz.
Um bolero ou tango
                          tange o tédio.
De repente, um tiro na noite.
Assassinato ou suicídio?
Último ato: cai o pano de silêncio
sobre o silêncio do morto.



Postal III


O Morro do Urubu
se muito foi terá sido
morro do urubu chumbado, morro do
urubu chagado, sifilítico e faminto.
O Morro do Urubu
hoje é Morro da Esperança.
Esperança de quem?
Daqueles que nada esperam
em sua ab / só / luta miséria.
Morro da Esperança????????
Morro dos bastardos da vida,
dos pobres, dos desvalidos.
Morro da morte matada,
morro da morte morrida,
morro da morte em vida:
Morro da (des) Esperança.



em Poemágico, A Nova Alquimia
Teresina: Projeto Petrônio Portela, 1985



CIDADE GRANDE




Dando (m)urros
no vazio
por causa da dor
              da doidice
da vida
da vivida mediocridade
entre ruas
       nuas sujas tristes
as ladras
   ladram como cães
e os cães
gemem como homens.
Na (c)idade
do lobo
o lobo-homem
é o lobisomem
           do homem.
Tudo é
ferro feio (en)ferrujado
ferindo feridas
já abertas.
Na cidade
na cilada
das suas ruas
surgem (g)ritos
lavados em sangue
lavrados a ferro e fogo.
Soltam berros
soltam (b)urros
prendem os b'rros
que incomodam.
Na cidade grande
onde não existe
pôr-de-sol
o homem gira e pira
sem (gira)sol.



em Poemágico, A Nova Alquimia
Teresina: Projeto Petrônio Portela, 1985

FLAGRANTES DE TERESINA




I


À meia-noite
percorria a praça.
A noite era silente e fria
e nenhuma estrela luzia...
O manto escuro tudo
envolvia e ninguém mais existia.
Apenas o olhar cego
do Conselheiro, ao longe,
indiferente, me via.



II


Em criança
a carranca do Barão
em seu assombro me fascinava.
Seu bigode recurvo espetava o ar
a ceifar a brisa como às nuvens
e ao céu o alfange lunar.
Um besouro inoportuno
bolinou o bigode do Barão
e o bigode de bronze
imperceptivelmente se moveu.



em Poemágico, A Nova Alquimia
Teresina: Projeto Petrônio Portela, 1985

Elmar Carvalho - síntese biográfica




José Elmar de Mélo Carvalho09/04/56 ] nasceu em Campo Maior – PI. Poeta, cronista, contista e crítico literário. Juiz de Direito. Bacharel em Direito e em Administração de Empresas. Presidiu o Diretório Acadêmico “3 de Março”, a União Brasileira de Escritores do Piauí e o Conselho Editorial da Fundação Cultural Monsenhor Chaves. Foi membro do Conselho Editorial da Universidade Federal do Piauí. Bibliografia: “A rosa dos ventos gerais”, “Cromos de Campo Maior”, “Noturno de Oeiras” e “Sete Cidades – roteiro de um passeio poético e sentimental”, entre outros. Participou de várias coletâneas e antologias.

17.10.13

INTRODUÇÃO




Esta cidade ardente, poucos homens a trazem na lembrança ou no coração. É uma cidade simples, tranquila. Aqui não há becos nem ladeiras, mistérios nem tradições. Cem anos não deixam acumular muita cousa na vida de uma cidade que já nasceu velha e que sempre teve o ar de uma aldeia grande, como notou um viajante ilustre e mal-humorado. Um ar que se transforma aos poucos com o correr do tempo e esta transformação indecisa mais o progresso ajudam a descaracterizar a cidade. Tem suas diferenças, é claro. O clima, as condições geográficas, a vida, as árvores. Outro viajante ilustre, porque gostasse de adjetivos ou porque realmente o impressionaram tantas copas verdes sobre os telhados desbotados, chamou-a Cidade Verde. Os naturais gostaram, o nome ficou. Hoje não existe mais aquele imenso arvoredo a que se referiam os cronistas do tempo, mas ainda se pode dizer que é uma cidade velada pelas árvores. Mangueiras e oitizeiros dão a sua sombra como frágil proteção contra o sol. O sol é muito claro, como se estivesse sempre em desespero, há excesso de luz nesta cidade. As cores se afirmam definitivamente, mas há predominância de tons claros. As casa claras e baixas, as roupas claras, os dias límpidos. Raros dias cinzentos e as chuvas, embora não sejam raras, chegam a ser uma distração. A marcha das estações é quase imperceptível. O tempo das chuvas e o estio. Em maio chegam brisas do Atlântico e dão à cidade um leve toque de primavera. Nesta época as madrugadas deixam um neblina tênue, que marca o fim do inverno. Depois é a soalheira. Meses mais tarde nuvens se formam ao nascente e começam as chuvas outra vez. Então alguns contemplativos descobrem que há bandos de aves voltando do Maranhão, cruzando o rio para o Piauí. São os patos e marrecas que voltam para as lagoas distantes. Assim se vai o tempo e a vida. O ritmo da vida é muito calmo. Os dias passam serenamente vazios, os rios descem o seu caminho, as nuvens seguem o seu curso, grandes cúmulos brancos na pura duração do azul. Os cafés se enchem de homens, os homens estão cheios de pó e de retórica, discutem política, negócio, amor e a vida dos outros. Há praças para os namorados, a quem a polícia não permite muitas expansões, cinemas, a missa dos domingos, os bailes, a cerveja e em qualquer lugar há sempre a música de um alto-falante. A cidade é aberta, sem segredos, acolhedora. Tem um ar de família que vem do fato de que quase toda gente tem relações ou se conhece. O que dá origem a uma intimidade deliciosa, como a daqueles dois que conversam em um dos cafés mais movimentados da cidade. Dizia um: "Ele é cretino, convencido, besta". Veio o garçom, bota a bandeja na mesa e entra naturalmente na conversa: "Quem é?" O que estava contando também responde naturalmente: "O Dr. F...".
em Roteiro sentimental e pitoresco de Teresina 
Prosa reunida | Teresina: Plug, 2007 [1952, 1ª edição]

APONTAMENTOS PARA UM POEMA DO RIO POTY




Mais na lembrança do que na paisagem
desce no seu caminho vagaroso um rio pobre.
Lento fluir de águas quase mortas.
Rio Poty
rio sem história
rio sem memória.

Um sinal de beleza nesse rio é uma cousa exterior a ele
e está confinado em palavras - o Porto do Noivos. Porque a
beleza não está propriamente no porto, mas nessa
denominação com tudo o que ela sugere de lirismo.

Algo fantástico nesse rio mal nutrido, meio devorado pelo 
sol: as arraias enterradas na lama que, há muitas águas
passadas, assombravam os moleques da manhã.
Como um pássaro mudo o rio humilde vai passando pelos
espaços do seu silêncio.
Rio Poty
rio sem surpresa
rio sem memória.



H. Dobal
em Obra Completa - I (poesia)
Teresina: Corisco, 1997