"Nas cidades (re) escritas: História, memória e espaços na narrativa de O. G. Rêgo de Carvalho" (2013), por Pedro Pio Fontineles Filho




RESUMO


O presente artigo objetiva analisar as percepções sobre cidade e patrimônio na obra do escritor piauiense, O. G. Rêgo de Carvalho, sobretudo tomando os limiares entre o rural e o urbano, bem como acerca dos espaços atuando nas práticas cotidianas e sendo constituídos pelas memórias. Metodologicamente, o artigo se constitui pela leitura analítico-interpretativa dos livros do escritor, que abordam o cotidiano dos sujeitos e suas relações com as paisagens e o patrimônio das cidades, especialmente de Oeiras e Teresina. As filiações teóricometodológicas acerca da cidade e patrimônio foram embasadas em autores como Wenders (1994), Choay (2001), Williams (1989), Santos (1999, 2008), Thomaz (1998) e Rolnik (1995, 1997). A narrativa literária se mostra como mais um discurso que (re) cria a realidade e que possibilita a visualização de outras sensibilidades e sociabilidades que se desenrolam na configuração do patrimônio em suas diferentes esferas.

Palavras-chave: História. Música. Engajamento. Identidade.




Trechos:


"A cidade em O. G. Rêgo de Carvalho surge como um ambiente, no qual vários sentidos se entrecruzam, no embate da memória entre o que poderia permanecer e o que mudaria na cidade e nas práticas dos sujeitos. Não se trata de um espaço de demarcações de elementos unicamente materiais, visto que a materialidade da cidade também é desencadeadora de reminiscências e de memórias para o autor, além de que ao lado da materialidade a cidade se constitui pelas dimensões sociais. Isso compõe, em larga medida, o universo do patrimônio cultural, do qual a literatura também faz parte. Em suas lembranças aparecem cidades polarizadas, conflitadas e de dimensões distintas, que ora se configuram como um atrativo, ora como um retrato das perdas e da implacabilidade do tempo na cidade e nos costumes". 


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"Vale ressaltar que, em meio a esse frenesi de cidades que se apresentam a partir de uma mesma cidade, a memória situada no tempo e no espaço faz com que as lembranças do indivíduo estejam muito mais atreladas a determinadas experiências de sua vida e seus valores. Isso explica o caráter da memória individual, ou melhor, autobiográfica do literato piauiense, pois tal memória “[...] não está inteiramente isolada e fechada. Para evocar seu próprio passado, em geral a pessoa precisa recorrer às lembranças de outras, e se transporta a pontos de referências que existem fora de si, determinados pela sociedade” (HALBWACKS, 2006, p. 72). As maneiras pelas quais a cidade é representada e sua relação na constituição de memórias transcende uma temporalidade fixada. Tal memória, mesmo que disfarçada de narrativa literária, aparece de maneira marcante na escrita de O. G. Rêgo de Carvalho, sendo que sua escrita não expressa somente a sua memória das cidades de Teresina e Oeiras, e em alguns momentos de Timon, mas também se constitui como memória desses mesmos espaços cujas sensibilidades de outrora já não são mais as mesmas".


HALBWACKS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Centauro, 2006.


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"A Teresina daquele momento era a cidade das lavadeiras na beira do rio, das movimentações das praças e dos namoros de que fala A. Tito Filho (1974). Ele, dentre outros aspectos, assim como O. G. Rêgo de Carvalho, também olha a Teresina daquela época como a cidade da jovialidade, das meninices e da sensualidade, pois lembra que “No final do parque da Bandeira – o Parnaíba – o velho monge de barbas brancas – como cantou Da Costa e Silva. Rio de água boa. Junto às suas margens, a gente ainda vê, como no outro rio, o Poti, as lavadeiras batendo roupa. Algumas de seios à mostra. Outras quase nuinhas como nasceram” (TITO FILHO, 1994, p. 48). É, dessa maneira, a cidade da juventude e das descobertas. O rio assume a função de lugar de sociabilidades, especialmente dos jovens e dos rapazes. Enquanto alguns bares franceses, como apontou Antoine Prost (1992), se tornaram espaços para as sociabilidades masculinas, as coroas que se formam quando o rio Parnaíba está mais seco se configuram como o ponto de encontro dos rapazes em Teresina. Lá eles trocam confidências, como quando Ulisses lembra de ter sido pego de súbito por uma pergunta de Norberto: “ – Ulisses, você já... – e fez um gesto despudorado” e Ulisses responde: “- Não – confessei, a vista baixando” (CARVALHO, 1981, p. 47), É também a cidade das ruas elegantes, bem arborizadas e de pessoas amigáveis, como fala O. G. Rêgo de Carvalho (1974), pois, para ele, a cidade era um lugar de encantamento".


CARVALHO, O. G. Rêgo de. Ulisses entre o amor e a morte. Teresina: Caderno de Letras Meridiano, 1981;
TITO FILHO, A. Teresina, meu amor. Teresina: Artenova S.A, 1974.


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FONTINELES FILHO, Pedro Pio. Nas cidades (re) escritas: História, memória e espaços na narrativa de O. G. Rêgo de Carvalho. Vozes, Pretérito & Devir Ano I, Vol. I, Num. I (2013). Dossiê Temático: Escritos sobre a história do Piauí. ISSN: 2317-1979.


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