O BAR DA ENCRUZILHADA, Deusdeth Nunes
Mais de trinta
anos de existência. Rua 24 de Janeiro, esquina com Olavo Bilac.
Maury Mauá de Queiroz. Sua maior patente foi ter sido presidente do
Piauí Esporte Clube. É o ponto preferido de uma seleta freguesia
cuja filosofia é ditada pelo seu mais legítimo e assíduo
representante, o poeta e vendedor de imóveis Jamerson Lemos: “Lá
ninguém é de ninguém e todo mundo é de todo mundo”. O Bar da Encruzilhada, nome dado pelo saudoso Eudes Pereira, tem suas regras
rígidas, que são cumpridas à risca pelo “caxias” proprietário.
Regra primeira: ninguém pode falar mal de ninguém que o Maury dá
esporro. Regra segunda: Não aceita jogo de nenhuma espécie entre os clientes, especialmente porrinha. Diz que lá não é cassino. Regra
terceira: Não serve a freguês que chega com instrumento musical,
alegando que lá não é estúdio de rádio. Regra quarta: Não
admite aparelhos musicais nem carros com sons tocando alto. Regra
quinta: Não serve a clientes que chegam sem camisa. Diz que quem
gostava de descamisado era o Collor e se deu mal.
Fiado tem, mas
só para cliente-ouro, aquele que se serve, alta confiança. O limite
do fiado é dado por ele. Sabe quando cada um pode pagar. Hoje o
tira-gosto é a fruta da época mas já teve tempo que o próprio
Maury fazia o assado. Diz que cansou. Maury distingue dois tipos de
fregueses: o cotidiano e o ocasional. O ocasional é recebido com
reservas, passa por um estágio de observação. Só é servido
depois dos cotidianistas. Se um novato reclama do atendimento, ele
esnoba, perguntando qual é o número da ficha dele e que aguarde a
vez. Os diaristas podem até mudar o canal do aparelho de TV.
Atualmente, o Maury já não bebe com os fregueses, mas já foi bom
nisso. Hoje, dizem que em virtude de uma cirrose que o deixou alguns
dias no hospital, ficou receoso de beber, embora garantam que ele
bebe escondido. A cara do dono não é lá essas simpatias, mas tem
vez que ele está com a macaca. Como da vez que o intelectual
Rubervam Du Nascimento ligou para 222-6502 pensando que era o
escritório do Jamerson Lemos, pois tinha anotado como tal. Quem
atendeu o telefone foi o próprio Maury, que já estava por conta com
o poeta por causa de um “prego”:
- Alô, o poeta
Jamerson Lemos está aí?
- Meu amigo,
aqui é do estabelecimento comercial do senhor Maury Mauá.
- Mas ele me deu
este telefone dizendo que era só chamar, ele é freguês daí...
- Rapaz, freguês
meu fica é na calçada!
E bateu o
telefone.
Mas o poeta
Jamerson não liga para as zangas do Maury e o imortalizou no seu
livro-poema As Suburbanas...
Saltando de bar
em bar
poisaram no
Encruzilhada.
Noturnamente
madrugada,
mas Maury ali
está
e mete cachaça
neles
e pede para
fechar.
em em A SAIDEIRA: De bar em bar,
Teresina: julho de 1997