SOB OUTROS CÉUS, Da Costa e Silva


IV



Eu sou tal qual o Parnaíba: existe
Dentro em meu ser uma tristeza inata,
Igual, talvez, à que no rio assiste
Ao refletir as árvores, na mata...

O seu destino em retratar consiste,
Porém o rio tudo o que retrata,
De alegre que era, vai tornando triste,
No fluido espelho móvel de ouro e prata...

Parece até que o rio tem saudade
Como eu, que também sou desta maneira,
Saudoso e triste em plena mocidade.

Dá-se em mim o fenômeno sombrio
Da refração das árvores da beira
Na superfície trêmula do rio...



Da Costa e Silva
em Pandora (1919)
apud A POESIA PIAUIENSE NO SÉCULO XX | Antologia
Organização, introdução e notas por Assis Brasil
Teresina / Rio de Janeiro: FCMC / Imago, 1995